A eleição presidencial chilena foi para o segundo turno e, pela primeira vez, a disputa será realizada em 15 de dezembro entre duas mulheres. Mesmo sem concluir a apuração, os resultados parciais deixavam claro que uma segunda rodada era irreversível. No fechamento desta edição, às 23h, com 94,62% das mesas apuradas, Bachelet estava com 46,74% dos votos, seguida por Matthei com 25,02%. Segundo a apuração, o ex-deputado socialista Marco Enríquez-Ominami e o economista independente Franco Parisi estavam cada um com pouco mais de 10% dos votos. Os chilenos também votaram para escolher 120 integrantes da Câmara dos Deputados e 20 das 38 cadeiras no Senado.
Mais de 13 milhões de eleitores estavam habilitados a votar nas eleições de ontem, a primeira a ser realizada com o voto facultativo. Um único incidente marcou o dia de eleições. À tarde, dezenas de estudantes ocuparam por duas horas a sede do comitê de campanha de Bachelet que se encontrava quase vazio. Os estudantes reafirmaram suas demandas por uma educação pública, gratuita e de qualidade e alertaram que continuarão protestando no próximo ano, assim como em 2011, quando tomaram as ruas com protestos que reuniram milhares de pessoas.
Bachelet, a primeira mulher a chegar à Presidência, tinha expressado seu desejo de vencer no primeiro turno, algo que não ocorre no Chile há duas décadas. “Gostaríamos e esse foi nosso esforço: convocar as pessoas a votar para ganhar no primeiro turno, porque há muitas coisas a fazer”, declarou uma sorridente Bachelet depois de votar na Região Leste de Santiago. Quando a apuração já indicava um segundo turno, ela declarou que trabalhará para ganhar a disputa. “Sabíamos que o desafio de ganhar no primeiro turno era complexo, fizemos um grande esforço e estivemos muito próximo de consegui-lo. Contudo, ganhamos esta noite e vamos trabalhar para ganhar amplamente em dezembro”, afirmou a ex-presidente, em discurso a seus aliados.
O Chile vive ainda entre a herança de ditadura do general Augusto Pinochet (1973-1990) e as reformas realizadas por três governos de esquerda. Depois de entregar a Presidência para seu sucessor, o conservador Sebastián Piñera, Bachelet decidiu tentar um retorno ao cargo, já que a Constituição chilena não permite a reeleição. A candidata socialista prometeu reformar o sistema da época da ditadura, que é considerado pela população como um dos motivos manter as classes trabalhadoras pobres e endividadas, privilegiando alguns poucos cidadãos.
O Chile é o maior produtor de cobre do mundo e sua economia em rápido crescimento, baixo desemprego e democracia estável são invejadas na América Latina, mas milhões de chilenos tomaram as ruas nos últimos anos, extravasando sua frustração com a enorme disparidade de riqueza entre ricos e pobres e com seu sistema de ensino.
Muitos eleitores culpam as políticas impostas durante a ditadura por manter a riqueza e o poder nas mãos de poucos. Seu regime privatizou os recursos naturais e muitas funções do governo, e acabou com o controle central e o financiamento das escolas públicas.
O desafio da ex-presidente, além de vencer a adversária no segundo turno, será implementar as reformas sem uma grande maioria no Congresso. Sua coligação Nova Maioria não será capaz de garantir mais assentos, a menos que ganhe pelo menos dois terços dos votos em cada distrito, conforme previsto no sistema eleitoral “binomial” de Pinochet, que foi projetado para frustrar mudanças. “Você quase sente pena dela, porque ela ficará presa entre o passado e o futuro”, disse o professor de ciência política da Wake Forest University, Peter Siavelis, autor de um livro sobre a política no Chile. “Há todas essas exigências nas ruas por reforma constitucional, mas ela estará diante de um Congresso que será eleito pelo sistema binominal”, comentou Siavelis. “Não será uma maioria lá. Assim, a influência da ditadura vai impactar em suas reformas.”