A avaliação sobre o estado da economia mundial, feita pelos principais banqueiros centrais do planeta, aponta para a continuação de uma desaceleração \”significativa\” este ano e retomada do crescimento global só em 2010. Planos de estímulos que os governos têm deflagrado ao redor do mundo vão servir mais para \”frear a queda\” da atividade econômica do que para reativar a economia este ano, na visão consensual de bancos centrais.
A velocidade das mudanças nos dados das economias exige mais prudência nas projeções que vêm sendo publicadas, ainda mais que cada nova que aparece é pior que a precedente. Em suas reuniões sigilosas, esta semana, no Banco de Compensações da Basiléia (BIS), em todo caso, banqueiros centrais examinaram um cenário que projeta crescimento de 1,1% da economia mundial este ano, refletindo o mergulho das principais economias na recessão global. Em 2007, quando a economia estava a pleno vapor, a expansão global foi de 4,8%. O impacto da crise sobre os emergentes, maior do que previsto, pode reduzir o crescimento do grupo para 4,2% este ano, comparado a 8,5% em 2007.
Pode-se falar mais em apostas, porque essa expansão dos emergentes se baseia num crescimento de 8% da economia chinesa. No entanto, a expectativa entre economistas de organizações internacionais é de que o Fundo Monetário Internacional (FMI) vai cravar expansão chinesa menor, por volta dos 6%, proximamente – o que significa ainda mais fechamento de milhares de fábricas, milhões de desempregados, menos importações, mais tensão social.
Existe preocupação também com a Índia, que vinha crescendo 6%. As suspeitas são grandes de que os indianos inflam suas estatísticas de crescimento, e a queda da atividade pode ser mais importante. Sobre o Brasil, até agora o BIS prevê crescimento de 2,8% em termos reais, cifra relativamente confortável em relação aos vizinhos. A outra grande economia latino-americana, o México, está golpeada pelo vizinho americano e só cresce 0,5% no máximo. A Argentina vinha crescendo 10%, mas o BIS acha que agora não passará de 1,9% este ano, derrubando demanda de produtos brasileiros, por exemplo.
O BIS projeta déficit de US$ 27 bilhões nas contas correntes do Brasil, um pouco acima do que o mercado prevê. A deterioração na balança de pagamentos dos emergentes será generalizada. O grupo terá saldo de US$ 491 bilhões no fim deste ano, numa queda importante em relação aos US$ 695,6 bilhões do ano passado.
Alguns banqueiros centrais se mostravam mais atentos ao estado da Rússia e eventuais turbulências políticas na Venezuela, por causa do preço baixo do petróleo. Moscou fez seu orçamento considerando, na pior hipótese, o preço do barril a US$ 80 – o dobro da cotação atual. A queima de reservas tem sido importante e já começou uma aparente confrontação entre o presidente Medvedev e o primeiro-ministro Putin sobre a recuperação econômica. Na Venezuela, o preço do barril de petróleo abaixo de US$ 75 torna insustentável para o presidente da Venezuela, Hugo Chavez, manter o ritmo de seus gastos públicos. Cada queda de US$ 10 no custo do barril significa perda de US$ 8,8 bilhões para a Venezuela. Com menos dinheiro em caixa, mais turbulências no novo sócio do Mercosul não são a excluir.
Na Basiléia, tampouco passou despercebida a irritação dos representantes da Arábia Saudita. A petromonarquia não tem problemas de tesouraria. Mas reclamou que os produtores de petróleo é que estão \”subvencionando\” na prática os pacotes de estímulos feitos pelos governos, com a queda do preço da matéria-prima. Os sauditas calculam que a poupança com importação e baixa do preço para o consumidor é maior que o valor dos pacotes, que equivale a 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Pelos últimos dados, o PIB ficava em US$ 64 trilhões.
De seu lado, certos banqueiros centrais europeus conclamaram os países com excedentes em suas contas externas – China, sobretudo -, a continuarem comprando produtos europeus, para permitir uma retomada econômica – isso quando os países industrializados demonstram apetite para frear mais produtos chineses.
A Alemanha, motor da economia européia, depende enormemente de exportações e espera que o mundo volte a comprar de novo para reativar sua economia. Só que este ano a queda nas exportações alemães pode chegar a 9% em termos reais, algo gigantesco em perdas de encomendas. Uma conseqüência simbólica é que os alemães poderão perder o posto de principal exportador mundial de mercadorias. Quem pode ocupar o posto é a China, mesmo com a queda de suas vendas.
Cresce também o consenso entre autoridades monetárias sobre a necessidade de revisão do Acordo de Basiléia 2, sobre exigências mínimas de capital em proporção do risco dos ativos. Alguns banqueiros consideram o acordo inaplicável e ineficaz, como a situação dos próprios bancos dos EUA comprova na crise atual.
Para o Brasil, as regras de Basiléia 2, no atual aperto global de crédito, podem ter efeitos ainda mais negativos no fluxo do comércio global, por exemplo, em vez de aumentar a estabilidade do sistema financeiro.
Conferência ministerial na OMC
A Organização Mundial do Comércio (OMC) deve realizar uma conferência ministerial este ano, como é previsto para cada dois anos. Se será uma ministerial negociadora ou apenas regular, vai depender dos rumos que o novo presidente dos EUA, Barack Obama, tomará.
O novo representante comercial americano, Ron Kirk, não deu indicações ainda da futura política comercial americana. Chama mais a atenção pelo estilo nas discussões. Fino político, ao invés de ficar falando de cifras, ele prefere comentar casos concretos. Uma de suas histórias preferidas é como pequenos comerciantes de Dallas, sua cidade no Texas, teriam aumentado suas exportações para o México graças ao Nafta (o acordo entre EUA, México e Canadá).