O sinal sonoro da mensagem do celular é ouvido pouco depois das 16h. Eduardo Cunha interrompe a entrevista, mira o telefone e permanece em silêncio por segundos infindáveis. E não consegue esconder a ansiedade. O rosto chega a mudar de cor. A partir daquele momento, há uma tensão poucas vezes vista naquele gabinete da presidência da Câmara dos Deputados. O peemedebista acaba de receber a informação de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a denúncia contra ele por corrupção e lavagem de dinheiro. Antes mesmo de acabar a entrevista, entram na sala os deputados Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), Rodrigo Maia (DEM-RJ), Mendonça Filho (DEM-PE) e Carlos Marun (PMDB-MS). Permanecem ali, parados, dando um tom ainda mais solene à notícia do dia.
Eduardo Cunha evitou detalhar a denúncia da Lava-Jato. Antes mesmo de receber a mensagem confirmando que a peça da Procuradoria-Geral da República havia chegado ao STF, ele disse que suspeitava do teor do documento. “Não posso falar sobre conteúdo da Lava-Jato, não posso entrar num nível de riscos, de detalhes aos quais eu precisarei responder juridicamente”, disse, considerando iniciado o processo jurídico. “Pois o processo político já existe, mas o processo jurídico tem de respeitar o ritual. Eu não posso atropelar o meu advogado, não posso atropelar aquilo que ele vai precisar para atestar (a minha inocência), não posso atropelar os argumentos que eu vou precisar utilizar.”
Em 53 minutos de entrevista, o peemedebista atacou o governo, os petistas, a Advocacia-Geral da União (AGU) e o procurador-geral da República. Na avaliação dele, a denúncia da Lava-Jato é apenas uma tentativa de tirar o foco do PT. “Eles querem companhia no banco dos réus. Eles acham que, se ficar todo mundo igual, é mais fácil para poder resolver”, disse.
No início do mês, Cunha se irritou com a AGU por ter sido avisado previamente da entrada do órgão no Supremo para anular as provas contra ele colhidas na Câmara em maio. “A AGU me prejudicou. Não tem a menor chance de ganhar aquele agravo. Eu vou tomar uma cacetada desnecessária.” No fim do dia, depois de ler as 85 páginas da denúncia, o peemedebista divulgou nota à imprensa. Na última quarta-feira, com o anúncio de que a denúncia estaria pronta, Eduardo Cunha assegurou que não renunciaria em nenhuma hipótese. Ontem, durante a entrevista, disse que a estratégia da PGR em anunciar a ação, ainda na quarta-feira, rendeu “duas manchetes”. “Eles fizeram isso para tentar ganhar força nas manifestações (a favor do governo).” Cunha foi o principal alvo de quem foi para a rua ontem em defesa da presidente Dilma Rousseff, em 25 unidades da Federação.
Por que o senhor não quer tratar sobre os termos da denúncia?
Eu não posso correr determinados tipos de riscos entrando em níveis de detalhes que eu precisarei responder juridicamente. A partir de agora, deixa de ser um processo político e passa a ser um processo jurídico. Mas o processo jurídico tem de respeitar o ritual. Eu não posso atropelar o meu advogado, não posso atropelar aquilo de que ele vai precisar para atestar (a minha inocência), não posso atropelar os argumentos que vou precisar utilizar. Por isso eu me insurgi com o negócio da Advocacia-Geral da União. A AGU me prejudicou. Além de ter sido uma agressão, me prejudicou.
Como assim?
A AGU utilizou argumentos que são argumentos de defesa. Não era para serem usados agora. São argumentos que devem ser utilizados pelo meu advogado no momento correto. Você não entra com agravo três meses depois; o agravo já perdeu o argumento há muito tempo. Eu vou tomar uma cacetada desnecessária, não tem a menor chance de ganhar aquele agravo. Qualquer estagiário de direito sabe que o que ele (Luís Inácio Adams) fez foi uma agressão. Ele usou a Advocacia-Geral da União, como um órgão do governo, para me criar problema. Agora terei de tomar cautela.
Qual é a avaliação do senhor sobre o anúncio antecipado da denúncia?
Eles fizeram isso para tentar ganhar força nas manifestações de hoje (ontem). E aí, o que acontece? Ele (Janot) quis gerar duas manchetes. A manchete de hoje (ontem) e a manchete de amanhã (hoje). Nós não nascemos ontem.
O senhor chegou a preparar um discurso para fazer em plenário?
Discurso? Jamais farei discurso. Eu não vou levar para o plenário essa confusão. Nem por um minuto. Vou deixar eles falarem à vontade, mas não vou levar para o plenário. Aqui é a instituição.
O governo trata a pauta que o senhor leva a plenário como pauta-bomba. É disso que se trata?
Por que as pautas que o governo acaba acordando são boas e as outras são ruins? Veja bem, o que você está falando de pauta-bomba — a PEC 443 (que trata de subsídios da carreira jurídica) — estava na pauta direto. Foi colocada aqui pelos líderes, eu retirei, houve acordo de governo com todos os líderes aqui na Mesa. Marcaram para agosto, o tempo que o governo precisava para chegar a um acordo. Quando chegou agosto, foi para a pauta. Aí, o governo chegou e disse: “Você tira”. Aí eu disse: “Eu não vou tirar. Vocês entram com requerimento, como eu faço com todas as matérias”. Eles entraram com requerimento e perderam. Aí a culpa é minha? Pelo contrário, eu paralisei a sessão quando houve requerimento, saí de lá para uma reunião de emergência, tentei fazer acordo, suspendi, passei para outro dia. Tentei acordo de novo e não consegui. Fui para a imprensa e dei uma declaração de que não votaria o segundo turno enquanto não votasse a PEC 172 (a do pacto federativo), promulgada. Então, eu sou detentor de pauta-bomba? Por que vocês não vão cobrar que o (presidente do Senado) Renan (Calheiros, do PMDB-AL) devolveu a medida provisória da desoneração? Por que vocês não cobram que atrasou dois meses e meio para votar um projeto que eu já mandei para lá desde junho? E eu sou detentor de pauta-bomba? Quem aprovou os reajustes do Judiciário? Não foi o Senado este ano? Eu que faço pauta-bomba? Quem foi reclamar que aprovou o fator previdenciário? Emenda votada, o que eu posso fazer? E ele (Renan) também não aprovou no Senado? Para o governo, falta base, o governo não tem base. O governo perdeu a própria base.
Como está a relação do senhor com Renan Calheiros?
Nos encontramos na terça-feira, participamos de um evento em conjunto, normal, educado…
O senhor pensa em fazer as pazes com o governo?
Todos os ministros que me procuraram, eu atendi. O ministro da Saúde, na semana passada, esteve aqui querendo aprovar um projeto de decreto legislativo. Eu fui lá, impedi a votação do decreto, patrocinei o acordo. Não tem esse negócio, qualquer um que venha aqui institucionalmente tratar de problemas de governo pode tratar normalmente. Eu não vou procurar ninguém, mas estou aqui à disposição.
A que o senhor atribui a denúncia da PGR?
Eles têm uma velha mania de querer companhia no banco dos réus.
Eles quem?
Alguns que gostam de companhia. Eles acham que, se ficar todo mundo igual, é mais fácil para poder resolver. Na prática, aconteceu o seguinte: eles começaram a semana com uma crise deles, por causa da manifestação, aí tentaram transferir a crise para cá. É simples, culminando com a manifestação hoje (ontem) que eles organizaram.
O procurador-geral, Rodrigo Janot? Não quero fazer acusação. Mas o senhor já falou anteriormente sobre esse tema…
Sim, aí já está falado. Aí você tira a conclusão.
Ao contrário de outras pessoas envolvidas, o senhor foi mais direto contra a PGR…
Eu falei tecnicamente, ponto a ponto, comparei as situações.
Minervino Júnior/CB/D.A Press “Eles acham que, se ficar todo mundo igual, é mais fácil para poder resolver. Eles começaram a semana com uma crise deles, por causa da manifestação, aí tentaram transferir a crise para cá”
Os ataques de petistas contra o senhor se intensificaram após o rompimento com o governo?
Na prática, quando eu anunciei o rompimento, qualquer ato meu parece retaliação. Isso foi o que vocês “compararam”, entre aspas. Na realidade, não tem nada diferente. Então, qualquer coisa que eu fale, estou retaliando. Isso não corresponde à verdade.
Na época em que o senhor anunciou o rompimento, algumas pessoas avaliaram como um arroubo, um ato açodado.
O rompimento foi para deixar claro, para eu ficar confortável nas minhas críticas ao governo, em todos os sentidos, e na tentativa de fazer meu partido sair do governo. É para deixar clara a minha militância. A presidência da Câmara não rompeu com o governo, mas sim o deputado.
É o momento mais crítico da sua trajetória?
Já fui denunciado, julgado e absolvido por unanimidade no Supremo. O ministro Gilmar Mendes aceitou a denúncia, ela foi para o pleno, que a aceitou, por 5 votos a 3. Na turma, por 5 a 0, fui absolvido. Então, já vivi esse momento. Só que, ali, foi uma denúncia feita pelo Roberto Gurgel. Num fato absolutamente absurdo, ele promoveu uma denúncia pelo entendimento dele. Mas você não me viu sair contestando, atacando, politizando. Posso não ter concordado, lutei, acabei absolvido pelas razões que eu tinha, pelo mérito. Era líder do PMDB, assim permaneci como réu, e, como líder, acabei absolvido, às vésperas da eleição. Fui julgado em agosto. Se fosse condenado, estava cassado. Então, já vivi esse processo. Aqui, na Casa, há 36 deputados com exposição penal, é normal. Temos de aprender que existe a presunção de inocência para todos. É o meu próprio exemplo. O Renan não está denunciado? Ninguém está cobrando do Renan afastamento porque está denunciado — e ele está denunciado, não por esse caso, mas por outros problemas dele. Então, por que só se cobra essa postura do presidente da Câmara? Ele é chefe de um Poder, do Congresso, eu sou só da Câmara. Embora exista o fato de eu estar à frente na sucessão (presidencial), o peso dele é maior do ponto de vista de importância, por chefiar o Congresso. Então, não vejo como um dos momentos mais difíceis na minha trajetória.
O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) disse ontem que haveria um acordão para livrar Renan e culpar o senhor.
Não vou comentar.
Tem a presunção de inocência, mas há o desgaste jurídico, com deputados pedindo seu afastamento…
São os mesmos deputados, adversários de sempre, dois que perderam a eleição para mim, mais uns 10. Não são nem adversários, mas desafetos. É diferente. Estou habituado com eles. Pelas circunstâncias, é normal. Não sou unanimidade nem pretendo ser. Eu sou só a maioria. Agora, aprendi que a maioria é que decide na vida. Eles fazem oposição a mim desde o primeiro dia. Eles têm de explicar é por que fazem oposição a mim em tudo. Eles fazem oposição até quando eu vou ao banheiro.
O senhor é habitual nas redes sociais. Incomoda-se com as críticas?
Existem críticas de robôs dos meus adversários, todos. Sou habituado a ver tudo. Por fim de semana, bloqueio de 200 a 300 tuiteiros. Isso é o que eu tenho paciência de ver. Vou até onde tenho saco. É normal, são robôs.
Fizemos uma entrevista com Jean Wyllys no último domingo. E ele fala que o senhor parece querer uma revanche em relação à Constituição Federal de 1988. Isso repercutiu nas redes.
Esse eu nem perco tempo comentando. Não merece comentário. É adversário do Rio de Janeiro, de vários temas, circunstâncias, teses. Alguém que tem projeto defendendo a mudança de sexo de crianças sem a autorização dos pais não merece crédito. Como é que você acha que uma criança de 12 anos pode, sem autorização dos pais, mudar de sexo? É óbvio que tenho de combater coisas dessa natureza. É a posição, é alguém protegido por vocês, da imprensa. Porque se eu fizesse um projeto assim, seria crucificado.
A imprensa é crítica em relação às suas posições?
Existe um pouco de ranço pela posição de eu ser evangélico e pelo meu temperamento de contestar as coisas com muita veemência. Há também o ranço daqueles contra quem movi processos. Admito que levo as brigas aos extremos. Agora até estou mais light.
O senhor se arrepende?
Nenhuma briga é boa, se puder evitar, melhor. Pago o boi para não entrar e a boiada para não sair.
Mas essa briga atual é maior, não?
Essa é política, e tem de ser tratada de acordo com sua dimensão. O tamanho que você tem é o tamanho da briga em que você está. Quanto maior você está, maior a briga.
Mas há a avaliação de que sua fragilidade aumentou..
Estou tão fragilizado que ontem (quarta-feira) aprovei, com 320 votos, em segundo turno, a redução da maioridade penal. Isolado com 320 votos? Na semana passada, aprovei, em segundo turno, o financiamento privado (de campanhas). Nesta semana, também passou o FGTS, que é bandeira minha. Acho errado o poder que me dão às vezes. O poder é da maioria. A gente fala e expressa a posição da maioria. Acho graça, as duas coisas estão erradas. Quando perco alguma coisa, estou isolado. Quando passo, sou superpoderoso. Começo a semana parecendo que tenho lepra; aprovo, viro superpoderoso. Acho que essas interpretações de isolamento ou de poder vêm muito pela necessidade de se comentar notícias que não são amparadas pelos fatos. Isso é normal, faz parte do tratamento que a mídia tem de ter na cobertura de política. Não acho que seja uma coisa nem outra. Não tenho razão para ficar isolado nem de ser superpoderoso, ainda mais quando estiver representando institucionalmente a Câmara. O que eu tenho que fazer é colocar as pautas. Não posso obrigar ninguém a votar comigo. Entregaram os anéis para não perder os dedos. Logo, não acho nem que fico isolado nem que sou superpoderoso.
Aliados dizem que o senhor cometeu erros na questão do relatório do deputado Marcelo Castro (PMDB-PI) sobre a reforma política…
O exercício do poder é limitado e ele acaba, pelas decisões que você é obrigado a tomar, a gerar algum tipo de sequela. Isso é inevitável. Da mesma forma que eu posso gerar sequela em alguma pessoa que era mais amiga, provavelmente consegui atrair quem era contra. Um dos grandes aliados que eu tenho hoje aqui é o Rogério Rosso (PSD-DF), que coordenou contra mim, votou contra mim. No caso do Marcelo Castro, me incomoda pessoalmente, porque gosto e tenho apreço por ele. Não gostaria que tivesse sido desse jeito. Foi um erro meu escolhê-lo como relator. Achei que ele combinaria o que fazer com líderes, mas ele não fez isso. Entendeu que tinha de votar como queria. Eu tinha um acordo com o Senado de que não mexeria no texto dos senadores, e ele sabia. Ele estava conduzindo um texto maluco na comissão, e os líderes não queriam. Foram eles que abortaram a votação. Completaram as 40 sessões e tive de trazer para o plenário. É lógico que Castro ficou incomodado, mas tive de seguir os líderes, não tive alternativa. Faz parte do exercício do poder. Deve ter mais quatro, cinco sequelas. É possível.
E em relação às manobras por emendas aglutinativas?
Não fiz nada que já não tenha sido feito antes na Casa. Tanto que ninguém conseguiu ganhar no Supremo essa questão.
Mas a senadora Rose de Freitas (PMDB-ES) ganhou na questão das contas…
Isso é outra coisa. Ela pediu para suspender a apreciação das contas (da Presidência da República) pela Câmara. Na minha modesta opinião, a decisão do ministro (do STF) Luís Roberto Barroso foi equivocada por três fatores. Primeiro, a ação perdeu o objeto porque as contas já haviam sido votadas. Segundo, a Rose é ilegítima como presidente para propor. Ela não votou na comissão, tinha de propor como senadora, tanto que foi contestada violentamente na comissão. Terceiro, a autoridade coautora não sou eu, mas o presidente do Congresso. Votei um decreto que me foi distribuído pelo presidente do Congresso para a Câmara votar. Três contas foram assim, e uma foi mandada para o Senado, que a votou, e eu votei na Câmara. Esse conceito de sair de comissão mista e só votar em sessão do Congresso resulta que não votaremos mais acordos internacionais nesta Casa. Tem de ser tudo em sessão de Congresso. E ainda tem outra questão: ninguém pode dar modulação em liminar. Apenas o plenário do Supremo, com oito votos. Pode até ser que o pleno do Supremo, na ação própria, entenda que as contas têm de ser votadas no Congresso e até module a decisão, mas não nessa ação. Mas são questões completamente diferentes. Ela não entrou contra a emenda aglutinativa. Essas são previstas no regimento e sempre foram utilizadas na Casa. Se você pegar a MP dos Portos, por exemplo, todas eram aglutinativas, e a maioria foi feita por mim, aceita e votada. Não inventei novidade. Acolhi o que era o regimento e são dois temas diferentes. E estou tranquilo, tanto que o Supremo não reformou qualquer decisão.
Vem aí uma série de pedidos de impeachment. Como eles serão processados na Casa?
Da forma como eu sempre falei publicamente. Eu pedi para que dessem os pareceres técnicos sobre aqueles que eu não recusei pelo requisito formal. Com base nesses pareceres técnicos, vou decidir. Já declarei publicamente e jamais modifiquei minha posição em relação a impeachment. Se pegar minhas declarações, você não verá qualquer declaração conflitante. Acho que o impeachment não é recurso eleitoral. O Brasil não pode ser tratado como republiqueta. O mandato anterior já se encerrou, então o pedido tem de se basear em fatos decorrentes deste mandato. Agora, isso não impede que alguém apresente alguma coisa em outro sentido. Isso não vai mudar com alinhamento político. Temos de ter respeito pelas instituições e respeitar a legitimidade de cada uma.
E esse pacote para evitar uma crise mais grave e atenuar a situação crítica do governo?
Não estou participando de pacto nenhum nem vou participar. Essas coisas que são muito subliminares, estereotipadas, acho muito pouco provável que aconteçam desse jeito. Ou o governo se sustenta, ou não. Ou a economia melhora, ou não melhora. Se você coloca as condições para que a economia melhore, colocamos. A única agenda do governo neste ano foram três medidas provisórias e um projeto para onerar empresas. Não houve nenhuma pauta para melhorar a economia. Se o governo quer terceirizar a pauta para melhorar a economia, é melhor entregar o ministério para todos os congressistas, porque não tem sentido. O governo tem de ter uma pauta, uma agenda, e não tem nada disso. Em vez de discutir o impeachment, eles deveriam recomeçar o segundo mandato. Ela devia impeachar esse governo dela, iniciar tudo de novo. Com agenda e pessoas afinadas com essa agenda, ir ao encontro do que ela discutiu na campanha, recompor a base em função dessa agenda. Se o governo não tem iniciativa de ser governo, vai ser o quê? Depender de terceirizações, pactos, acordões? Na minha avaliação, em vez de discutir o impeachment dela, ela devia discutir o impeachment do governo dela e começar de novo o segundo mandato.
Essa proximidade do Planalto com o presidente do Senado é uma tentativa de isolar o senhor?
Veja, é um sistema bicameral. É uma ingenuidade pensar que você vai isolar o presidente da Câmara. Não consegue. Todas as medidas provisórias começam e terminam aqui. Os projetos de urgência constitucional começam aqui e terminam aqui. Não adianta ele (Renan) aprovar e aqui não andar, como também não adianta nada a gente aprovar aqui e não andar lá. Tem que aprender a respeitar. Sistema bicameral não pressupõe que uma Casa vai se sobrepor à outra. E mais: a própria reação corporativa da Casa aqui a esse tipo de movimento é meteórica contra o governo.
Minervino Júnior/CB/D.A Press “O PT ainda não acabou, nem acho que vá acabar, mas vai, obviamente, ficar muito menor do que já foi. E não será mais opção de poder no país depois do exercício deste mandato”
Mas essa aproximação do Renan fez com que o governo respirasse um pouco…
Sim, talvez seja o seguinte: como há uma percepção que está sem qualquer tipo de apoio no Congresso, quando sinaliza que tem uma Casa que pode estar atuando em conjunto, eles acham que sinaliza uma melhora. É aquela velha história, o doente está internado e tira um tubo, mas continua no CTI.
Há quanto tempo o senhor e Dilma não se falam?
Acho que uma semana antes de eu ter feito o movimento (de rompimento, em 17 de julho). Foi a última vez que eu falei com ela.
E com Temer?
Quase todo dia.
Os tucanos falam num movimento do PMDB em prol do afastamento da presidenteDilma. O senhor acha que isso é possível, este ano?
Eu não vou discutir esse tipo de relação. O movimento ao qual eu defendo é que o PMDB saia do governo.
Mas a oposição já não está ocupada pelo PSDB? Tem Aécio, Alckmin… Não fica uma oposição meio lusco-fusco com o PMDB?
A oposição perdeu as eleições para ela (Dilma) e está, de certa forma, fazendo confronto na continuidade do processo. O PMDB pode, de repente, fazer uma oposição diferente. Primeiro, tem que decidir se sai do governo. Pode sair do governo e ficar independente.
Como o vice sai do governo?
Ele não sai. Ele está eleito.
Ele não sai e o partido sai?
E se o PT resolvesse sair do governo?
Se o PT sai do governo, fica mal..
Mas não tira a legitimidade de Dilma, ela foi eleita. Como não tira a legitimidade dele (Temer). Eu não estou defendendo disputar espaço com o PSDB, estou defendendo sair do governo. Sair do governo não significa ser oposição, pode ser independente. Política não é uma ciência exata. É uma ciência absolutamente inexata. Esses movimentos não se dão por aí. O PMDB pode sair do governo e não precisa derrubar o governo. O PMDB só vai colar sua imagem a essa imagem de um governo ruim que só 7% da população aprovam. O PMDB tem de sair da agenda dos 7%.
Mas não soa uma coisa assim: se aproveitou enquanto estava bom…
Não. O negócio já está ruim há muito tempo. Não somos nós. O PMDB não manda no governo, nunca mandou, nunca foi responsável pela política econômica ou por qualquer política pública desse governo. O governo é o PT, quem manda é o PT, nós estamos lá apenas para dar apoio parlamentar e fingir que ocupamos espaço no governo, essa é a verdade. O PMDB tem de se recompor, não pode ficar a reboque, dependendo de mais um ministério. Porque eu assisti ao Renan dizer que o Temer virou um coordenador de recursos humanos quando ele assumiu a coordenação política. Não foi isso que ele disse? Que o Temer não podia virar coordenador de recursos humanos? Talvez ele esteja certo. O pior é que ele (Michel Temer) manda nomear e não nomeiam.
Quem vai ser o candidato do PMDB ao Planalto em 2018?
Está muito longe isso…
Mas o partido vai ter candidato?
Com certeza absoluta.
Eduardo Paes é um nome?
Acho um bom nome. Dependendo do sucesso das Olimpíadas do ano que vem, talvez seja o melhor quadro político.
O senhor se colocaria como candidato?
Jamais colocaria uma posição futura no exercício de uma posição presente. Nunca usei os cargos pelos quais passei para fazer disputa pelo seguinte. Quando era líder, não construí candidatura a presidente da Câmara.
A defesa de projetos considerados polêmicos o atrapalham?
Acho que não. Ter posição não pode ser fator de desabonar ninguém. Somos obrigados a defender posições pelas quais fomos eleitos, todos nós. Não sou só eu. Quando você vê o militar subindo à tribuna e defendendo o interesse dos militares, ele foi eleito pelos militares. Se ele não os defender, não merece estar ali. É diferente do Senado, onde há representantes dos estados.
Em relação às denúncias da Lava-Jato, falta, aqui no Congresso, uma defesa mais veemente de alguns pares do senhor?
Eu não vou entrar nessa história.
Estamos falando isso porque, de certa forma, no caso do PT, há defensores, mesmo depois de denúncias…
Existe uma guerra interna no PT muito grande. Uma corrente minoritária quer aniquilar uma corrente majoritária. Isso é claro e nítido, e qualquer um que conhece política sabe que isso está ocorrendo. Essa guerra interna do PT se reflete para fora (do partido). O que uma corrente majoritária do PT não faria, a minoritária faz para constranger a majoritária e faz também para os constranger internamente. Só que é a corrente minoritária que está mandando no governo, não a majoritária. Por isso o PT está afastado do governo.
Qual é a corrente que está afastada hoje?
A do Lula, que é a maioria do partido.
O PT acabou?
Não. O PT ainda tem um percentual, embora pequeno, pelo tamanho da população, mas ainda tem um percentual de apoiamento pela militância que ele fez. O PT ainda não acabou, nem acho que vá acabar, mas o PT vai, obviamente, ficar muito menor do que já foi. E não será mais opção de poder no país depois do exercício deste mandato.