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28 de fevereiro de 2024Há tempos o Fisco vem demonstrando considerável tenacidade no objetivo de sedimentar expedientes ilegais, contrariando até mesmo o entendimento do STJ, que por meio da recentíssima Súmula n.º 430, dispôs literalmente que “o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade do sócio-gerente”.
No afã de obter recursos financeiros em prol do Estado, os Procuradores insistem em direcionar os feitos executivos fiscais contra os sócios das empresas contribuintes, ao argumento de que inexistem bens das pessoas jurídicas aptos a satisfazer a suposta dívida. Tal procedimento é praxe tanto em execuções fiscais de débitos das esferas do Poder Executivo (União, estados e municípios), quanto em cobranças de débitos previdenciários.
Evidente que há uma confusão conceitual que determina tal agir por parte do Estado. Nesse ponto importa distinguir rapidamente os conceitos de inadimplência e sonegação fiscal: a primeira não é crime e portanto não gera a responsabilização pessoal da pessoa física que integra a empresa; a sonegação, por outro lado, importa em ilícito, com a respectiva fixação de pena em desfavor dos réus.
Em recente decisão, o STJ indeferiu Recurso Especial da Fazenda Pública, expressando mais uma vez o entendimento de que não cabe o redirecionamento da execução fiscal contra os sócios das empresas de capital aberto ou mesmo das limitadas. Transcrevemos abaixo um trecho do acórdão:
No mérito, esta Corte pacificou o entendimento no sentido de que o simples inadimplemento da obrigação tributária não caracteriza infração legal para fins de responsabilização do sócio-gerente. Ademais, frise-se que há necessidade de o Fisco provar que o sócio agiu com excesso de poderes ou infração à lei ou ao estatuto social da empresa a fim de responsabilizá-lo, o que, segundo o Tribunal a quo, não foram configurados.
A propósito, confiram-se a jurisprudência deste Sodalício:
PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – OFENSA AO ART. 535, II DO CPC – INOCORRÊNCIA – DISSOLUÇÃO IRREGULAR – SÓCIO-GERENTE – REDIRECIONAMENTO – INTERPRETAÇÃO DO ART. 135, INCISO III, DO CTN.
[…]
2. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que o simples inadimplemento da obrigação tributária não caracteriza infração à lei, de modo a ensejar a redirecionamento da execução para a pessoa dos sócios.
[…]
7. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1.017.732⁄RS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ de 7.4.2008)
TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE. SÓCIO-GERENTE. LIMITES. ART. 135, III, DO CTN. ÔNUS DA PROVA. INOVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. É entendimento deste Tribunal que o mero inadimplemento não caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha agido com excesso de poderes, ou infração de contrato social ou estatutos, não há falar-se em responsabilidade tributária do ex-sócio a esse título ou a título de infração legal.
2. Apesar de aceitável a nova tese trazida pelo agravante no sentido de se inverter o ônus da prova em relação ao sócio-gerente inscrito em CDA, não tem o presente recurso o condão de modificar o conteúdo do recurso negado, porquanto não ventilado no âmbito do apelo nobre, que se restringiu a discutir a aplicação do art. 135 do CTN.
Agravo regimental não-provido. (AgRg no REsp 957.265⁄ES, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, DJ de 25.02.2008)
EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS. COMPROVAÇÃO DO EXCESSO DE PODERES, INFRAÇÃO À LEI OU AO ESTATUTO. CASO EM QUE O NOME DOS SÓCIOS CONSTAVA DA CDA. PRESUNÇÃO DE LIQUIDEZ E CERTEZA NÃO ABALADA.
I – Restou firmado no âmbito da Primeira Seção desta Corte o entendimento de que, sendo a execução proposta somente contra a sociedade, a Fazenda Pública deve comprovar a infração a lei, contrato social ou estatuto ou a dissolução irregular da sociedade para fins de re-direcionar a execução contra o sócio, pois o mero inadimplemento da obrigação tributária principal ou a ausência de bens penhoráveis da empresa não ensejam o redirecionamento.
[…]
III – Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 981.998⁄SP, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 12.03.2008)
Muito embora o entendimento impresso na referida Súmula redundar de reiteradas decisões do STJ, verifica-se que o Fisco tem por medida reiterada o redirecionamento dos executivos fiscais contra os sócios das pessoas jurídicas, ignorando assim a orientação jurisprudencial. Nesse ínterim, importa frisar que a dívida pode ser garantida por patrimônio de terceiro, desde que respeitados os ditames legais. O CPC esclarece que estão sujeitos à execução os bens do sócio nos limites do determinado na lei . Tal limite é fixado pelo art. 135 do Código Tributário Nacional , o qual admite a responsabilização dos sócios sempre e quando comprovados o excesso de poderes ou a infração a lei, contrato social ou estatuto.
Quando da constituição da sociedade comercial, com a integralização do capital social, nasce a pessoa jurídica, com autonomia, vontade e patrimônio próprios, não havendo confusão com a personalidade civil dos sócios, salvo as exceções acima indicadas.
Também o CPC, por meio de seu artigo 596, salienta a separação de patrimônio entre sócios e pessoa jurídica, ao determinar que “os bens particulares dos sócios não responderão pelas dívidas da sociedade senão nos casos previstos em lei”. Em se tratando de sociedade limitada, o Código Civil estabelece que a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, conforme redação do artigo 1.052.
Por fim, ressalte-se que o artigo 13 da Lei n.º 8620/93, restou revogado pelo art. 79, VII, da Lei n.º 11.941/2009 . O dispositivo revogado aduzia que quanto aos débitos junto à Seguridade Social, eram responsáveis solidários o titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada. Igual situação se aplicava aos acionistas controladores, administradores, gerentes e diretores, os quais estavam obrigados a responder solidariamente e subsidiariamente, com seus bens pessoais, quanto ao inadimplemento das obrigações para com a Seguridade Social. Tal obrigação se dava nos casos de inadimplemento doloso ou culposo.
Espera-se que agora, a partir da orientação jurisprudencial emanada pela mais alta instância do Poder Judiciário brasileiro, o Fisco abstenha-se de tais práticas, e que os Juízes e Tribunais apliquem o teor da Súmula, rechaçando assim medidas ilegais perpetradas pelo Estado em detrimento do contribuinte.
Dra. Julia Fiorese Reis