Os tribunais superiores (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal), ao interpretar a legislação tributária, têm consolidado entendimentos sobre a tributação de juros, bem como sobre as implicações fiscais na devolução de valores depositados e na repetição do indébito tributário, este último referente à restituição e/ou compensação de créditos oriundos de quantias pagas indevidamente ou a maior pelo contribuinte ao erário.
Dois temas de grande relevância nesse contexto são o Tema 504 e o Tema 505, ambos definidos no julgamento do REsp 1.138.695-SC, sob o rito dos recursos repetitivos. Embora tratem de aspectos distintos, essas decisões impactam significativamente a tributação dos juros, gerando implicações tanto para os contribuintes quanto para o fisco.
O Tema 504 trata da natureza jurídica dos juros incidentes sobre os depósitos judiciais e sua consequente tributação. Em sua decisão, o STJ entendeu que os juros pagos na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória. Ou seja, os juros não são apenas uma compensação pela demora na devolução do valor, mas sim uma forma de remuneração do capital que ficou retido durante o período da disputa judicial.
Já o Tema 505 do STJ aborda um outro aspecto da tributação dos juros, mas com um enfoque específico sobre os juros Selic que incidem sobre a repetição do indébito tributário. Nesse caso, o STJ determinou que os juros Selic, quando decorrentes da repetição do indébito tributário, devem compor a base de cálculo do IR e da CSLL dada a sua natureza de lucros cessantes. Ou seja, os juros pagos a título de correção e compensação no processo de repetição do indébito tributário deveriam ser considerados receita tributável para fins de apuração desses impostos.
Essas decisões trouxeram implicações para o tratamento tributário dos juros, pois, ao assumir a característica remuneratória, eles estão sujeitos à tributação dos tributos incidentes sobre o acréscimo patrimonial, tais como aquele incidentes sobre o lucro das empresas — IRPJ e CSLL. A natureza remuneratória caracteriza os juros como uma receita tributável, sujeita às mesmas normas de tributação que outras receitas de natureza similar.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal também se pronunciou sobre o assunto, no julgamento do Tema 962 pelo rito da repercussão geral, entendendo ser inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário, ainda decidiu que não caberia, naquela demanda, estabelecer a natureza jurídica dos juros relativos aos depósitos judiciais.
O fundamento para não tributação da taxa Selic pelos tributos federais sobre o lucro é que “os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário visam, precipuamente, a recompor efetivas perdas (danos emergentes). A demora na restituição do indébito tributário faz com que o credor busque meios alternativos ou mesmo heterodoxos para atender a suas necessidades, os quais atraem juros, multas, outros passivos, outras despesas ou mesmo preços mais elevados”.
Em sede de julgamento de embargos de declaração, o STF ainda esclareceu que a não incidência do IRPJ e CSLL da Selic, na repetição de indébito tributário, aplica-se inclusive na compensação do crédito tributário, ou seja, pouco importa se a recuperação foi administrativa ou judicial, e mais, modulou os efeitos da decisão, estabelecendo que ela produza efeitos prospectivos a partir de 30/9/2021, ficando ressalvados: a) as ações ajuizadas até 17/9/2021 (data do início do julgamento do mérito); b) os fatos geradores anteriores a 30/9/2021 em relação aos quais não tenha havido o pagamento do IRPJ ou da CSLL.
É importante esclarecer que existiu uma cronologia nesses julgamentos. Primeiro o STJ definiu as teses dos Temas 504 e 505 em maio de 2013, posteriormente, o STF, por entender que a matéria é constitucional, afinal, a definição da base econômica da tributação sobre renda e proventos de qualquer natureza é prevista no artigo 153, III, da Constituição, julgou o Tema 962 em setembro de 2021.
Assim, o STJ, em sede de juízo de retratação ocorrida em abril de 2023, readequou a tese do Tema 505, para fazer constar que os “Os juros Selic incidentes na repetição do indébito tributário se encontram fora da base de cálculo do IR e da CSLL, havendo que ser observada a modulação prevista no Tema n. 962 da Repercussão Geral do STF – Precedentes: RE n. 1.063.187/SC e Edcl no RE n. 1.063.187/SC”.
Quanto ao Tema 504 do STJ, este permaneceu inalterado pelo Superior Tribunal, sob o argumento de que a tese firmada por ocasião do julgamento do Tema 962/STF diz respeito tão somente à “incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário”, restando expressamente afastada a extensão da decisão ao levantamento de depósitos judiciais.
O último capítulo no STJ se deu com o julgamento de embargos de declaração, referente a decisão de retratação, ocorrido em 20/2/2025, tendo a corte superior entendido que, por congruência, a retratação somente pode se dar em relação aos juros do indébito tributário e seus reflexos tributários, e não ao depósito judicial, posto que somente o primeiro foi objeto de decisão pelo Supremo.
Ademais, o STF já concluiu que a questão da incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores relativos à Selic sobre o levantamento de depósitos judiciais é infraconstitucional, ou seja, a palavra final deverá ser do STJ, tendo sido negado a repercussão geral ao Tema 1.243.
Percebe-se que essas decisões refletem a complexidade da tributação de juros no Brasil e a importância de um correto entendimento sobre sua natureza para o adequado cumprimento das obrigações tributárias, além de possibilitar um planejamento tributário mais eficiente para as empresas.
Fonte: Conjur