Frederico Rizzo captou investimentos por meio de crowdfunding para desenvolver um negócio que ainda encontra restrições no Brasil – a captação de investimentos via crowdfunding.
“A legislação é muito pouco específica e o mundo todo tem tentado aprender a criar um arcabouço jurídico que proteja o pequeno investidor”, diz Rizzo, sócio-fundador e presidente da plataforma de investimentos coletivos Broota.
Diferentemente de um crowdfunding convencional, em que um grupo de pessoas banca um projeto sem expectativa de lucrar com ele, no investimento coletivo – ou equity crowdfunding, como é conhecida a modalidade –, o investidor está em busca de retorno financeiro. Só que, em vez de em ações negociadas em bolsa, compra títulos de uma empresa iniciante ou – como já ocorre nos Estados Unidos e na Inglaterra – cotas de um imóvel, por exemplo .
Como há papéis envolvidos, o investimento coletivo precisa ser comunicado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o xerife do mercado de capitais.
O Broota foi primeiro empreendimento – e o único, até agora – a dar esse passo, e obteve a dispensa de registro para captar R$ 200 mil, equivalente a cerca de 15% do valor estimado da empresa, segundo Rizzo.
A plataforma conta com um portfólio de sete empresas iniciantes, que buscam entre R$ 150 mil a R$ 500 mil para desenvolver negócios que vão de uma fábrica de bebidas orgânicas a uma plataforma online de ensino. Mas nenhuma começou a arrecadar.
“Creio que no próximo mês teremos uma empresa pronta para captar”, diz Rizzo. A projeção é chegar a R$ 4 milhões captados para dez projetos no primeiro ano de operação, segundo o prospecto da Broota.
Gerente de Aperfeiçoamento de Normas da CVM, Antônio Carlos Berwanger diz que até agora apenas outras plataformas de crowdfunding procuraram a autarquia.
“Emissores [empresas que buscam financiamento] de fato não temos recebido. Temos recebido apenas plataformas”, diz, em entrevista ao iG.
Conceito novo, regulamentação antiga
Embora o conceito de investimento via crowdfunding seja novo, esse tipo de captação de recursos tem se baseado numa legislação de 2003, que dispensa de registro na CVM a emissão de titulos de micro e pequenas empresas (MPEs), e na legislação sobre negócios desse porte, que é de 2006.
“Hoje não existe nenhum entrave na regulamentação [para investimento via crowdfunding]”, diz Berwanger. “Isso já estava contido na instrução para emissores que queiram ofertar valores mobiliários por outros meios, mas que pode ser utilizada pelo emissor que queira fazer crowdfunding.”
As regras atuais, entretanto, impõem algumas dificuldades. Uma delas é que, por lei, as MPEs só podem ser sociedades limitadas (Ltdas.), o que as obriga ofertar não de cotas da empresa – como poderia ser feito com uma sociedade anônima (S/As) ou uma sociedade em conta de participação (SCPs), mas títulos de dívida.
Na Broota, Rizzo e os sócios captaram os R$ 200 mil com a emissão de títulos, mas eles com a promessa de poderem ser convertidas em cotas da empresa no futuro, se o negócio for para a frente.
Berwanger reconhece que a restrição “não permite formatos [empresariais] mais apropriados para o crowdfunding” e prevê sua retirada pelo Congresso ou pela própria CVM, se a autarquia decidir criar uma regulamentação própria para o investimento coletivo.
Uma regulamentação própria também deverá alterar o limite de captação, hoje em R$ 2,4 milhões por ano – o que torna difícil, por exemplo, a captação de investimento coletivo para um projeto imobiliário, como a construção de um edifício.
“[O limite de R$ 2,4 milhões] é um valor e, como todo valor, tem de ser revisto. Tudo o que envolve valor, quando você está fazendo uma revisão, você dá uma olhada com carinho para ver se está adequado”, diz o gerente de Aperfeiçoamento de Normas da CVM.
Há ainda outros quatro pontos que podem ser aperfeiçoados, na visão de Berwanger, caso a CVM venha a editar uma regulamentação específica do crowdfunding. Dois deles se referem à divulgação de informações ao mercado tanto na oferta como durante a existência dos títulos.
“Teria de estar num modelo informacional adequado para o formato crowdfunding que obviamente não vai ser o modelo das companhias abertas [que pressupõe publicação de relatórios em jornais de grande circulação, por exemplo].”
Outra questão é definir as regras para as plataformas de crowdfunding – como o Broota – e para a participação dos investidores nesse mercado.
“Se ela [a CVM] eventualmente decidir uma regulamentação específica, esses pontos fatalmente serão endereçados nessa norma”, afirma o gerente da CVM.
Investimento é de alto risco
A Broota espera começar a dar lucro em 2016 – cerca de R$ 300 mil sobre um faturamento de aproximadamente R$ 1,5 milhão. Foram ofertados 32 títulos com vencimento em cinco anos, quando poderão ser convertidos em títulos em ações preferenciais (sem direito a voto). A remuneração é de 3% ao ano, sem atualização monetária.
Como botar dinheiro num negócio iniciante, pioneiro, num mercado sem regulamentação específica é um investimento de alto risco, os responsáveis pela empresa decidiram restringir a captação a investidores qualificados – que possuem ao menos R$ 300 mil em ativos financeiros –, embora essa limitação não seja obrigatória.
“A tendência é abrirmos [para investidores não qualificados], mas fazer isso com calma”, diz Rizzo.
Apesar da restrição, o empresário afirma que a demanda pelos títulos da empresa foi acima do esperado: os R$ 200 mil foram bancados por 28 investidores, que incluem amigos e familiares, mas também desconhecidos, como o presidente de uma empresa da área de finanças e tecnologia, um fudo de investimentos em capital de risco e gente do mercado financeiro.
“Hoje eu conheço 90% dos que investiram, pois me reuni com eles. Mas antes de começar o processo, eu conhecia 10% deles.”