PEC dos Gastos: problema não de forma, mas de conteúdo e de controle político-legislativo
17 de dezembro de 2024Em 12 de dezembro de 2024, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei Complementar 68/2024 (PLP 68/2024), que regulamenta aspectos essenciais da Reforma Tributária sobre o consumo.
Este texto agora retorna à Câmara dos Deputados para apreciação final, antes de seguir para sanção presidencial.
Durante as discussões no Senado, foram realizadas mudanças significativas no texto original, trazendo impactos relevantes para empresas e contribuintes.
Dentre as medidas aprovadas, destacam-se:
Alterações na carga tributária: alíquota de referência estimada foi ajustada de 27,97% para 28,67%, caracterizando a Reforma Fiscal como verdadeiro aumento de impostos, no exclusivo propósito de arrecadar mais. É certo que foi abandonada a intenção de simplificar o sistema e, mais uma vez nossos legisladores trabalham para as demandas arrecadadoras do Poder Executivo e de Centralização do Poder Político.
Segundo projeções preliminares divulgadas pelo relator da Reforma Fiscal foram excluídos do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) alguns setores , a saber …
Condomínios, consórcios e nanoempreendedores (pessoas físicas com receita bruta inferior a R$ 40,5 mil/ano);
Fundos de investimento;
Produtos rural com receita inferior a R$ 3,6 milhões/ano;
Transportadores autônomos de carga (pessoa física);
Entidades sem fins lucrativos que operam planos de assistência à saúde por autogestão;
Entidades de previdência complementar fechada;
Fundos patrimoniais.
Por outro lado criaram-se Tratamentos Diferenciados para IBS e CBS para outros setores e atividades da economia …
Ficou definida Alíquota 0% de IBS e CBS para dispositivos médicos, dispositivos de acessibilidade, automóveis nacionais para pessoas com deficiência ou taxistas, medicamentos específicos, produtos para saúde menstrual, hortifrutícolas, serviços prestados por ICTs sem fins lucrativos e transporte coletivo rodoviário e metroviário.
Alíquotas de IBS e CBS com Redução de 60% para os setores de saneamento, educação, saúde, produções culturais e esportivas, além de fornecimento de medicamentos, alimentos e higiene básica, produtos agropecuários in natura, todos com suas respectivas regras e condições.
Alíquotas de IBS e CBS com Redução de 30% da alíquota para prestadores de serviços de atividades intelectuais de natureza científica, literária ou artística. Os beneficiados incluem: advogados, arquitetos, engenheiros, contadores, entre outros submetidos a fiscalização de conselhos profissionais, condicionado ao cumprimento de determinados requisitos.
Incentivos fiscais ficaram definidos a partir da criação de Crédito presumido que será abatido do IBS e CB a pagar, para as atividades de transporte de carga de transportador autônomo pessoa física, aquisições de resíduos sólidos para destinação final ambientalmente adequada e aquisição, para revenda, de bem imóvel usado de pessoa física. Para CBS, há previsão de concessão de crédito presumido até 2032 ao setor automotivo, para produção de veículos elétricos.
Regimes de apuração e arrecadação específicos aplicáveis aos setores de energia, combustíveis, serviços financeiros, planos de saúde, operações imobiliárias, cooperativas, turismo, bares e restaurante, SAF, loterias e missões diplomáticas.
A Reforma Fiscal em alguns pontos manteve IBS CBS em Regime de Arrecadação Antecipada, por meio da já conhecida Substituição tributária para produtos como bebidas alcoólicas, refrigerantes, água mineral, cigarros e outros derivados do fumo. E este caso é bem emblemático porque no início da Reforma Fiscal uma das bandeiras era exatamente a extinção desta modalidade de arrecadação. Agora tudo ficou a depender de regulamentação do Comitê Gestor do IBS e da Secretaria Especial da Receita Federal.
Além do IBC e CBS introduzidos na Reforma, o Imposto Seletivo (IS) passa a se configurar, com a exclusão da incidência, quanto a equipamentos de segurança coletiva e individual, tais como Armas e munições. Com muita sabedoria estes itens foram excluídos da lista de incidência do tributo. E pensando no incentivo ao desenvolvimento regional os Pequenos produtores de bebidas alcoólicas também poderão ter alíquotas diferenciadas, sendo encaminhada a proposta ‘a Câmara de Deputados Federais.
Quanto a Região Norte, que sozinha possui cerca de 20 senadores e dezenas de deputados foram garantidas a ampliação extensão da validade das Áreas de Livre Comércio (ALC) até 2073, ao invés de 2050, alinhando-se ao prazo da Zona Franca de Manaus (ZFM). É bom registrar que são os Estado do Centro Sul do Brasil que são responsáveis por mais de 70% da geração e arrecadação de impostos, porque reúne cerca de 70% do comércio, indústria, serviços e dos empregos nacionais. Com certeza um ponto fora da linha.
A Reforma Fiscal – ao lado de benefícios como Bolsa Família, Salário Educação, Vale Gás, Vale Transporte, FGTS e outros benefícios – , agora cria o “Cashback” para famílias de baixa renda. Trata-se de mecanismo de devolução de tributos via cashback, incluindo agora despesas com telefonia e internet. Se pudéssemos comparar com a Dinamarca, até o ano de 1961, quando ainda eram muitos os benefícios sociais pagos a população, como é o caso do brasil atual, o cidadão que recebia ajuda do governo não poderia votar, porque o fenômeno caracterizava uma espécie de “ compra de voto”. Depois de 1962, com o robustecimento da economia e da riqueza da população, os benefícios diminuíram e o direito a voto retornou pleno.
Ocorre que o Brasil de hoje, vale fazer a crítica, não é nada diferente da Dinamarca de antes de 1961. Nos dois casos os benefícios fiscais eram e ainda são utilizados para comprar votos de forma institucionalizada, lamentavelmente.
Sobre Imóveis, outras alterações na Reforma Fiscal merecem comentário: O Local do fato gerador no caso de administração ou intermediação de imóveis será o do local do fato gerador será o local do imóvel. Sobre o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) a Tributação de doações, as doações sem contraprestação serão tributadas com base no valor de mercado ou haverá anulação dos créditos apropriados pelo doador. Por fim, será aplicado um Redutor social em operações imobiliárias, para diminuir o valor da base de cálculo de transações imobiliárias, de R$ 100 mil para compra de imóveis novos, R$ 30 mil na compra de lote residencial e R$ 600,00 para aluguéis residenciais. Além disso, houve um aumento na redução das alíquotas do IBS e CBS para transações imobiliárias, passando de 40% para 50% em todas as operações com imóveis, e de 60% para 70% nas operações de locação, cessão onerosa e arrendamento.
Portanto, – em meio a maior instabilidade política e econômica que a história da recente democracia brasileira vive, somado ao caos que se reproduz dentro de um Congresso Nacional composto por muitos senadores e deputados envolvidos em casos conhecidos de corrupção, vota-se a REFORMA FISCAL há muito desejada no Brasil. E assim segue à Câmara de Deputados Federais o primeiro projeto aprovado pelo Senado Federal que regulamenta a Reforma Tributária sobre o consumo, instituída pela Emenda Constitucional n. 132/2023. E este retorno do texto à Câmara dos Deputados, como já era de se esperar, chega aos Deputados em meio a deputados presos, deputados processados, escanda-los de emendas secretas, que se somam a especulações sobre possíveis revisões parciais das alterações realizadas pelo Senado, especialmente em razão do aumento projetado na alíquota de referência.
Professor Édison Freitas de Siqueira (Presidente do IEED – Instituto de Estudos Econômicos e do Direito – Presidente da Edison Freitas de Siqueira Advs Associados)