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20 de dezembro de 2024A definição do sujeito ativo do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sempre foi marcada por debates, sendo a regra geral disposta no artigo 3º da Lei Complementar nº 116/2003, que dispõe que o imposto será devido ao município do “(…) local do estabelecimento prestador (…)”.
Esse conceito é mais bem trabalhado no subsequente artigo 4º como sendo “o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional”, destacando, ainda, a irrelevância das “denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas”.
Tendo o legislador ainda deixado certa margem interpretativa, coube ao Judiciário, ao longo dos anos posteriores à Lei Complementar nº 116/2003, fixar os limites da referida definição, o que foi feito pelo egrégio STJ na análise do Recurso Especial 1.060.210/SC, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (Tema 355). A corte, naquela oportunidade, assentou que “(…) (b) o sujeito ativo da relação tributária, na vigência do DL 406/68, é o Município da sede do estabelecimento prestador (art. 12); (c) a partir da LC 116/03, é aquele onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional (…)”.
Ou seja, para fatos geradores ocorridos a partir da vigência da LC 116/03, deve ser considerado o local onde o serviço for efetivamente prestado.
A despeito da tese jurídica firmada, é de amplo conhecimento que muito embora o leading case tenha sido julgado considerando as especificidades inerentes às operações de arrendamento mercantil e leasing financeiro, a própria Corte Superior já se manifestou no sentido de que as premissas lá estabelecidas se aplicam a todas as atividades não excepcionadas pela legislação de regência, especialmente aos casos que envolvam conflito de competência sobre a incidência do referido imposto, em razão de o estabelecimento prestador se localizar em município diverso daquele em que realizado o serviço objeto de tributação.
No caso de uma sociedade prestadora de serviços médicos que esteja sediada em local distinto daquele no qual efetivamente desempenhe suas atividades, com a dissociação do conceito de “estabelecimento prestador” do local de sua sede ou filial, para que seja possível aferir o destinatário final do referido tributo, passa a ser necessária a verificação do local onde o serviço é efetivamente prestado, bem como se há, nele, unidade autônoma ou profissional que possibilite o deslocamento da capacidade tributária ativa.
A exemplo, pensemos em uma pessoa jurídica que participe de credenciamentos públicos visando a prestação de serviços médicos para a administração pública e que, inobstante sua sede esteja localizada em determinado município, é contratada para desempenhar suas atividades em outra localidade, fora do limite territorial da cidade em que está sediada. Neste cenário, caso essa interpretação não seja observada, a sociedade fica sujeita à cobrança do ISS tanto por parte do município onde está localizada sua sede, quanto por parte do município onde efetivamente desempenha suas atividades, o que pode acarretar prejuízos irreversíveis, inclusive de ordem patrimonial.
Para que se possa vislumbrar a solução mais adequada para estes casos, é fundamental examinar a questão da sujeição ativa do ISS à luz da natureza intrínseca dos serviços médicos, que, por sua essência, exigem prestação contínua e que, por força de contrato firmado, devem ser executados exclusivamente nas dependências do contratante, sendo necessária a presença física do médico, bem como a existência de estrutura devidamente equipada.
Partindo desta premissa e considerando que a própria regra matriz de incidência do ISS nem permite outra conclusão, haja vista que o local da prestação do serviço será aquele em que o prestador cumpre com o seu dever jurídico, na forma do contrato celebrado com o tomador, os tribunais passaram a, cada vez mais, abordar este entendimento em suas decisões.
Extrai-se, portanto, da jurisprudência que vem sendo consolidada, que o complexo de coisas que constituem o núcleo habitual do exercício da atividade médico-hospitalar caracteriza unidade econômica ou profissional, independentemente de o lugar ser ou não formalmente considerado como filial ou sede do contribuinte.
A questão inclusive chegou no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, por meio do Recurso Especial nº 1.774.005/SP. Naquele caso, que envolvia justamente a competência para cobrança do ISS no caso de prestação de serviço médico em contrato firmado com a administração pública, a corte reformou acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do de São Paulo, sob o entendimento de que, em se tratando de serviços médicos cujo fato gerador do ISS tenha ocorrido na vigência da Lei Complementar nº 116/2003, o sujeito ativo da relação tributária deve ser compreendido como sendo o município no qual o serviço foi efetivamente prestado, independentemente de ter sido prestado em estabelecimento mantido pelo tomador dos serviços, e reconhecendo, ainda, a aplicação ao caso da tese firmada no julgamento do Tema nº 355 do STJ (REsp 1.060.210/SC).
A justificativa para isso é simples: permitir que a legislação municipal relativa ao ISS possa produzir efeitos sobre serviços prestados fora do município que a editou é conduta que viola diretamente o critério territorial de repartição das competências.
Nas palavras de Roque Antonio Carrazza, o serviço prestado no município “A” deverá nele ser tributado pelo ISS, ainda que o estabelecimento prestador da sociedade esteja sediado no município “B”. Admitir o contrário, seria o mesmo que permitir que a lei do município “B” seja dotada de extraterritorialidade, de modo a irradiar efeitos sobre o fato ocorrido no território de município onde ela não poderia ter voga.
Fonte: Conjur