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18 de abril de 2024A falta de clareza das regras que sujeitaram operações com commodities ao cálculo de preço de transferência para tributação em breve vai provocar forte contencioso na Receita Federal. A expectativa é do ex-subsecretário de Fiscalização do órgão Marcos Vinicius Neder (foto), hoje consultor no escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados. Para ele, há mais dúvidas que respostas nos conceitos criados pela recente Lei 12.715/2012, regulamentada pela Instrução Normativa 1.312/2012 da Receita. O que significa que casos concretos devem levar uma chuva de contestações a julgamentos administrativos no órgão.
“Definir quem está sujeito, se as publicações sobre o preço das commodities podem ser usadas como base de cálculo, como agir no caso de produtos similares aos listados pelo Fisco, se a Receita tem poder de arbitrar valores e quais são os ajustes possíveis para determinar o preço final, tudo isso está em aberto e pode criar contencioso”, afirmou o advogado e professor da FGV e da PUC-SP ao palestrar em evento sobre o tema em São Paulo, nesta quinta-feira (20/6). A VII Jornada de Debates sobre Questões Polêmicas de Direito Tributário é organizada pela FISCOSoft e vai até esta sexta-feira (21/6). No primeiro dia, cerca de 150 pessoas compareceram.
O preço de transferência é definido por lei para operações de importação ou exportação de bens e serviços entre empresas vinculadas — subsidiárias ou coligadas com sede em diferentes países. Suas regras sofreram alterações com a publicação da Medida Provisória 563/2012 em abril do ano passado que, posteriormente, foi convertida na Lei 12.715/2012. A lei, no entanto, gerou insegurança. Um dos motivos foi a referência a commodities entre os produtos sujeitos à regra. A menção genérica na lei não especificou quais produtos estariam sujeitos à aplicação do Método do Preço sob Cotação na Importação (PCI) e do Método do Preço sob Cotação na Exportação (PECEX) — novas metodologias de cálculo ancoradas nos preços praticados em bolsas de mercadorias e futuro.
Nesses dois métodos, a média ponderada da cotação do produto na data da transação é feita com base nas cotações das commodities em bolsas ou em informações de instituições de pesquisas setoriais internacionalmente reconhecidas. Na IN 1.312, a Receita listou 22 bolsas e sete entidades setoriais a cujas cotações e divulgações de preços os contribuintes passaram a ter de acompanhar.
A IN teve o intuito de acabar com planejamentos tributários que utilizavam, de acordo com regra anterior, o lucro estimado de 15% para exportar commodities destinadas à venda em outros países, onde a margem de lucro é maior. Exportadores brasileiros de commodities podiam calcular o preço de transferência conforme o método do Custo de Aquisição ou de Produção mais Tributos e Lucro (CAP). O método envolvia o custo de produção acrescido dos tributos incidentes e margem de lucro de 15%.
Além disso, antes da IN, provar ter 5% de lucro sobre receitas de exportação livrava as empresas de se submeterem ao preço de transferência. Depois da norma, a margem subiu para 10%. Mas a dispensa não vale se a receita líquida de exportação para pessoas jurídicas vinculadas ultrapassar 20% do total vendido ao exterior.
Mas o que ainda intriga é o que pode ser considerado uma commodity e os conflitos decorrentes da resposta a essa pergunta. “A empresa pode ter de apresentar provas de que seu caso merece usar outros critérios que não a cotação em bolsa”, exemplifica Neder. Isso porque o Anexo I da IN elencou taxativamente produtos que devem ser considerados commodities — e estão sujeitos ao método PECEX.
A lista inclui não apenas produtos in natura, como o cacau, por exemplo, mas também os derivados, como o chocolate. Se o produto comercializado pelo contribuinte não se encaixar em nenhuma das opções, ele deve provar isso e procurar seu preço base em publicações de instituições especializadas. O problema é que preço usar como base de cálculo da tributação. “No caso concreto, quando o fiscal identificar na empresa o produto, vai haver discussão sobre o preço a ser usado”, alerta Neder.
Nesse aspecto, ele afirma que a Instrução Normativa acabou indevidamente ampliando o rol de commodities previsto na lei que ela apenas regulamentava. Isso porque a lei não listou quais bens não são listados em bolsa, mas a instrução, sim, como: açúcar, algodão, alumínio, cacau, café, carnes, carvão, cobre, estanho e farelo de soja.
“Vai surgir a dúvida para o contribuinte se seu produto está na norma ou não, e se ele está obrigado a aplicar o parâmetro a produtos idênticos ou similares”, explica o consultor. No entanto, ele lembrou que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais — que julga contestações de contribuintes a autuações tributárias federais — já decidiu, em caso que não envolvia commodities, que a presunção para definição de preço de transferência é limitada.
“Por ser uma presunção legal, a comprovação do excesso de custo pelo Fisco deve ser cercada de maior rigor”, diz o acórdão 01-06.014 da Câmara Superior do órgão, lavrado em 2008. “A jurisprudência indica que, se não for o produto listado, dificilmente a comparação será aceita”, traduz Neder. “No método PECEX não há qualquer determinação legal expressa que autorize ou obrigue sua extensão a produtos similares.”
Mesmo quanto aos produtos listados em bolsa, as cotações podem gerar discussões entre empresas e fiscalização. Isso porque o “prêmio de mercado” — em que se baseia o preço do produto a ser usado como base — varia nas bolsas a depender do que for fixado em contrato para a comercialização. “O prêmio é definido por condições de mercado, de oferta e procura. Qualidade, quantidade e localização influenciam indiretamente o prêmio, embora não o definam. O grau de subjetividade do método é grande”, afirma Neder.
Como os produtos ficam armazenados nas bolsas de mercadorias e futuro, é comum haver custos com frete, seguro, acondicionamento e armazenagem, perdas no transporte e decorrentes de variações climáticas e valores pagos pela intermediação, que estão incluídos no valor da cotação.
Já para o exportador, a norma brasileira não permite descontar do valor da cotação usado para comparação nada a não ser “custo de transporte ao porto de destino e influências climáticas”. “Mas e se o transporte foi feito via aérea ou rodoviária?”, questiona o advogado. “Se eu comparar esse preço com o da venda direta — e bolsa lida com venda direta —, essas comparações merecem ajuste. Numa próxima edição, essa IN deve ser corrigida.” Segundo ele, o próprio Fisco entra em contradição ao permitir ajustes maiores nos preços quando a exportação é feita para empresas não vinculadas — pelo método PEVEX —, mas não nos das commodities, sujeitas ao PECEX.