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18 de abril de 2024O dia internacional do consumidor, celebrado em 15 de março, é geralmente, marcado por eventos organizados por entidades de defesa do consumidor. PROCONs costumam promover palestras, lançar cartilhas e realizar o atendimento da população, para orientá-la sobre seus direitos como consumidora.
Dentre os diversos temas abordados, o consumo consciente e o superendividamento sempre ganham destaque. Neste ano não foi diferente, por dois motivos. O alto endividamento das famílias brasileiras e as discussões sobre alguns pontos da Lei do superendividamento (Lei 14181/21).
Publicada em julho do ano passado para incluir o tema no Código de Defesa do Consumidor, ela ainda desperta controvérsias. A maior delas refere-se a um ponto que o legislador preferiu deixar para regulação posterior: a definição do mínimo existencial.
O superendividamento, segundo a definição agora contida no CDC, pode ser entendido como a impossibilidade manifesta de o consumidor pagar a totalidade de suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo existencial. Ele deve ser preservado tanto no momento de fornecimento do crédito quanto no caso de renegociações futuras.
A Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON) ficou incumbida de editar um decreto para definir este conceito. O órgão tem realizado e divulgado estudos sobre o tema, mas ainda não há previsão de publicação do documento.
Enquanto isso, bancos e instituições de defesa do consumidor vêm manifestando seu entendimento sobre os critérios que devem ser adotados.
A questão é complexa, pois estamos diante de um conceito variável e subjetivo. Compreender o que seria um mínimo para se viver dignamente é simples. Seria um percentual da renda suficiente para assegurar a um indivíduo e sua família o acesso a alimentação, moradia, saúde, educação e outras necessidades tidas como básicas. As controvérsias surgem quando se busca um critério para se definir um patamar que o represente.
Poderia a lei definir um valor único para todos os consumidores? Imagine que se defina o salário mínimo como o valor do mínimo existencial. Caso um consumidor deseje obter um crédito pessoal, a instituição financeira deverá analisar se o pagamento das parcelas mensais não comprometerá aquela parcela, ou seja, deverá ser preservado para o consumidor o valor de um salário mínimo em seu orçamento para o pagamento de suas despesas básicas. Esta não parece ser a melhor solução, pois dificultaria o acesso ao crédito por grande parte da população brasileira.
Outra opção seria definir um percentual da renda, como ocorre hoje, com os empréstimos consignados em folha de pagamento de servidores. No caso deles, a lei permite a consignação de apenas 30% do salário. Assim, indiretamente, pode-se entender que o mínimo existencial corresponde a 70% de seus proventos.
Em países como a França (um dos primeiros a regular o superendividamento), o mínimo existencial é definido segundo este critério de desconto proporcional à renda, com a adoção de percentuais que variarão de acordo com a remuneração recebida pelo tomador do crédito. Eles são previstos pela legislação trabalhista que define faixas de descontos baseadas no valor do salário.
Este sistema também é defendido pela professora Cláudia Lima Marques, referência no assunto na doutrina brasileira. Para ela, deve-se manter de 70% a 65% o percentual relativo ao mínimo existencial, se a renda for entre 01 a 05 salários-mínimos. O percentual poderia ser aumentado no caso de faixas superiores de remuneração.
Para a Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN), o conceito precisa ser objetivo. A entidade é contra a adoção do mínimo a partir de um percentual sobre a renda do consumidor, conforme manifestou um de seus representantes. Para ele, esse critério seria discriminatório e poderia gerar uma retração no fornecimento de crédito, deixando alguns consumidores já endividados em situação ainda mais difícil.
Entidades de defesa do consumidor como o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), por sua vez, defendem que a análise do mínimo existencial deve ser feita caso a caso, avaliando o perfil de cada postulante ao crédito. Seriam levados em consideração fatores e características do consumidor como dívidas já existentes, composição da renda familiar, tipo de vínculo de empregatício ou aposentadoria, etc.
Já alguns PROCONs têm se antecipado ao governo federal e editado normas internas para tratar do assunto. É o caso do PROCON do Maranhão que criou uma resolução prevendo que o cálculo do mínimo existencial deverá levar em conta a situação familiar, de moradia, de alimentação e vestuário mínimo do consumidor. Ele deverá ficar entre 60% e 65%, para aqueles consumidores que tenham renda de 01 a 05 salários mínimos e poderá ser estendido para 50% da remuneração para aqueles que recebam de 05 a 10 salários mínimos.
Por fim, vale mencionar que o tema ganhou um importante precedente no judiciário nesta semana. O Superior Tribunal de Justiça fixou uma tese de que descontos de parcelas de empréstimos comuns (não consignados) em conta corrente podem ultrapassar o percentual de 30%. No caso discutido, o tribunal entendeu que o limite previsto na lei que regula os empréstimos em folha de pagamento não serve como referencial para se observar o mínimo existencial do correntista e que não cabe ao judiciário defini-lo.