O bilionário Eike Batista entrou em uma esteira de especulações, que envolvem o governo, o Itamaraty e a empresa de Cingapura Sembcorp Marineo, responsável pela construção do estaleiro Jurong de Aracruz, no Espírito Santo. Isto porque informações dão conta de que representantes do grupo e o governo tentaram transferir o empreendimento para o Porto do Açu, do Grupo EBX, de Eike, localizado no norte do Rio.
A denúncia teve início com um pronunciamento do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) em plenário na última quinta-feira (13), no qual acusou o diplomata Luís Fernando Serra de fazer lobby para o empresário carioca. Acuado, o embaixador brasileiro em Cingapura afirmou à revista Época que foi procurado diversas vezes por Amaury Pires, ex-diretor do Fundo da Marinha Mercante e executivo do grupo EBX, e pelo próprio ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, para que agendasse um encontro com os executivos estrangeiros. Segundo Serra, a alegação era de que o investimento coincidiria com as vontades do governo e do megaempresário.
Pires foi um dos 27 exonerados pela presidente Dilma Rousseff após os escândalos de corrupção e desvio de verba no Ministério dos Transportes, em 2011. Ele teria chegado ao grupo EBX por intermédio de Flávio Godinho, ex-executivo da holding, e atualmente no departamento de futebol do Flamengo.
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Segundo o senador pemedebista, o ministro Pimentel alegou que seu nome foi utilizado “indevidademente” pelo representante do Itamaraty. Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Ferraço pediu na semana passada apuração rigorosa do caso pelo MRE.
“(…) O estaleiro Jurong já está em construção em meu Estado, com 15% a 20% das suas obras físicas realizadas. Que sentido faz subtrair esse empreendimento, já viabilizado em no Espírito Santo? Que sentido faz se valer do nome e da pressão do Governo Federal para transferir esse empreendimento para outro estado?”, discursou no Congresso o parlamentar. “(…) Iremos às últimas consequências para que atos como esse sejam uma página virada em nossas relações institucionais”, finalizou.
MRE considera caso encerrado
Em entrevista coletiva nesta quinta-feira, o ministro da Relações Exteriores, Antonio Patriota, afirmou que, embora não tenha conversado com o embaixador Serra, o caso pode ser considerado praticamente encerrado.
“Não tive a oportunidade de conversar com o embaixador Serra, mas tenham certeza de que serão dadas todas as garantias de que não existe favorecimento de investimentos privados de companhias de qualquer país ou em benefício de um estado em detrimento de outro”, garantiu o ministro.
Segundo ele, é preciso levar em conta as declarações do governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, de que os investimentos serão mantidos no estado. “Mas vou conversar com o embaixador e vamos fornecer as informações necessárias”, completou.
Porto do Açu: dificuldades de viabilização
O Porto do Açu, cujo investimento é orçado em mais de R$ 4 bilhões, sofreu algumas derrotas no ano passado e a incerteza ronda o empreendimento. Em novembro, a siderúrgica estatal chinesa Wuhan Iron and Steel Corporation (Wisco) desistiu de sua participação no complexo, alegando falta de infraestrutura necessária para o projeto. Pensado para a siderurgia, o porto agora recebe investimentos de empresas de petróleo e gás.
Além disso, o Ministério Público Federal do Rio (MPF-RJ) já moveu ação civil pública pedindo o fim das obras de instalação do porto. Segundo o órgão, pesquisas da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) detectaram que as obras causaram a salinização em áreas do solo, de águas doces em canais e lagoas e de água tratada para o consumo humano.
Em nota, o MPF ainda pediu liminarmente “o adiamento do início da operação do Porto do Açu, enquanto não forem comprovadas a restauração ambiental e a ausência de ameaças ao equilíbrio ambiental da área, e que o Inea suspenda as licenças de operação emitidas ou por emitir relacionadas às obras, enquanto a recuperação do meio ambiente não for comprovada”.
Mercado reage
A questão, segundo analistas de mercado ouvidos pelo JB, foi que Eike Batista vendeu um grande projeto, objeto de muito interesse pelo mercado, mas ainda não conseguiu realizar estes investimentos. Nesta semana, um artigo da agência de notícias Bloomberg trazia uma conta, revelada por fontes não identificadas, de que instituições financeiras de prestígio já haviam capitalizado o grupo X com mais de R$ 12 bilhões. E pressionavam por resultados ou garantias que reverteriam o investimento em lucro.
O noticiário adverso contribui bastante para uma performance negativa da holding de Eike e o mercado poderia estar pressionando por isso, segundo avaliaram analistas. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) informou que “acompanha e analisa as operações envolvendo companhias abertas e adota as medidas cabíveis, quando necessário”, mas que não comenta casos específicos.
As ações do grupo vêm sofrendo quedas acentuadas no mercado de capitais, e o noticiário não ajuda o desempenho. Como exemplo, a OGX Petróleo perdeu, somente neste ano, quase 45% de seu valor de mercado. “O papel da OGX chegou a quase R$ 23, um patamar próximo ao da Petrobras, e hoje está em R$ 2,50. Ela é uma empresa pré-operacional e estava entre as cinco de maior liquidez na bolsa”, ressaltou um analista que não quis se identificar.
No ano passado, o grupo já vinha abrindo mão de uma série de participações de seus empreendimentos e fazendo acordos para se capitalizar. Em março, a Mubadala, empresa ligada ao Fundo Soberano dos Emirados Árabes, investiu US$ 2 bilhões na EBX. Em maio, a General Eletric (GE) comprou 0,8% da EBX, por US$ 300 milhões.
Nas empresas do grupo, a IBM comprou 20% de participação na SIX, em abril, e o processo de venda de 30% da CCX já teria sido iniciado, mas o investidor não foi revelado. Nesta semana, a MPX Energia informou, em fato relevante ao mercado, que Eike Batista negociará uma fatia das ações da empresa, sem, entretanto, revelar mais sobre o assunto.
Em setembro do ano passado, em nota ao Jornal do Brasil, a EBX afirmou que estava capitalizada, “com cerca de US$ 9 bilhões em caixa, recursos suficientes para garantir a execução dos projetos desenvolvidos no País. Todas as companhias de capital aberto do Grupo EBX vêm cumprindo seus planos de negócios em dia, com funding substancialmente equacionado para os próximos anos”.
Bolsa
No mercado de valores, empresas do grupo tiveram as maiores perdas do pregão desta quinta-feira. A ações da mineradora MMX recuaram 7,02%, o que, segundo analistas, seria decorrente do resultado do quarto trimestre do ano passado divulgado nesta semana. Os ativos da OGX, depois de terem avançado nos últimos três dias, encerraram a sessão com queda de 4,58%. Os papéis da LLX caíram 4,93%.