Resultado da expansão das operações lá fora, investimento de companhias nacionais no exterior chega a US$ 15,6 bilhões.
O Brasil tornou-se um investidor cobiçado no mundo. Fortalecidas em relação às companhias cujas matrizes localizam-se em países que sofreram mais os impactos da crise global, as empresas nacionais avançam em seu processo de internacionalização. Agora, são os mercados desenvolvidos que buscam atrair os recursos dos brasileiros. França e Holanda, por exemplo, abriram este ano agências no país com o objetivo de levar reais para seus mercados.
Dados do Banco Central (BC) mostram que, de janeiro a agosto de 2010, o valor líquido da participação das empresas nacionais em outros países totalizou US$ 15,612 bilhões, comparável ao das estrangeiras no Brasil, que chegou a US$ 16,906 bilhões. Trata-se de uma mudança significativa diante do que ocorreu no ano passado, quando os investimentos brasileiros no exterior resultaram em envio de US$ 4,545 bilhões e os ingressos no país atingiram US$ 25,949 bilhões.
Levando em consideração os empréstimos dentro de um mesmo grupo multinacional, o Investimento Brasileiro Direto (IBD) lá fora totalizou US$ 5,577 bilhões e o Investimento Estrangeiro Direto (IED) aqui dentro ficou em US$ 17,130 bilhões. O governo faz uma projeção de US$ 12 bilhões para o IBD e de US$ 38 bilhões para o IED em 2010, mas já trabalha com um cenário em que o hiato(1) do valor líquido diminui, podendo até mesmo ocorrer uma inversão de cenário, em que as remessas ao exterior possam superar a chegada.
“A crise deixou muitos países com ativos baratos e o real forte aumenta o poder de compra das empresas nacionais, que estão vendo a internacionalização como forma de escapar das barreiras ao comércio e de divulgar suas marcas”, avalia o secretário de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Welber Barral. Entre as 20 companhias que integram o topo do ranking das marcas mais valorizadas do país, elaborado pela BrandAnalytics, 10 estão em processo de internacionalização. “O potencial de investimentos de uma empresa no exterior influencia muito a sua imagem”, acredita o diretor da consultoria Eduardo Tomiya.
Copa do Mundo
Braskem e Gerdau são exemplos de consolidação dessa tendência: ambas fizeram importantes aquisições nos Estados Unidos em 2010. “É uma tremenda mudança. As empresas do Brasil estão deixando de ser jogadoras do campeonato brasileiro para jogar na Copa do Mundo”, afirma o vice-presidente de Negócios Internacionais da Braskem, Roberto Ramos. Segundo ele, a compra da Sudoku Quemical foi uma questão de boa oportunidade: “Pagamos menos do que se tivéssemos de compor aquela capacidade produtiva nos Estados Unidos.” Com a crise, diminui a concorrência e caem os preços. “Estávamos em melhores condições para aquisição porque sentimos menos os efeitos da crise, em que o Brasil teve uma retração de menos de 1%, enquanto outros países viram suas economias caírem até 9%. De uma hora para outra, ficamos 10% mais importantes no mundo do que éramos”, calcula.
A compra da companhia norte-americana para produção de propileno — o plástico mais usado em componentes de veículos — é apenas uma das pontas da estratégia de internacionalização da Braskem, que pretende investir cerca de US$ 12 bilhões nos próximos 10 anos no exterior. “Planejamos ter fábricas na Bolívia, no Peru, na Venezuela e no México”, revela Ramos. O avanço sobre os vizinhos latino-americanos é importante para integrar os mercados produtores ao principal consumidor, os EUA, para o qual a Braskem reserva outros planos: “Os brasileiros estão trabalhando muito bem com os norte-americanos. Isso nos deixa esperançosos para fazer novas aquisições lá nos próximos 12 meses”.
Para o diretor-presidente da Gerdau, André Gerdau Johannpeter, a recente compra da siderúrgica Tamco por US$ 165 milhões e a participação em torno de 34% na Gerdau Ameristeel representam passos importantes em território norte-americano. “Continuaremos a avaliar seletivamente as oportunidades de mercado que surjam e que estejam alinhadas à estratégia de rentabilidade e crescimento com sustentabilidade da empresa”, afirma. O executivo acrescenta que o foco de atuação da companhia no momento é a integração das empresas. Em 2009, 53% da receita líquida do grupo foi gerada pelas unidades no exterior. De 2010 a 2014, a Gerdau irá investir cerca de R$ 2,2 bilhões fora do país.
1 – Debilidade
A saída de recursos do país seria um fator de pressão nas contas externas, mas o governo avalia que o fato de o IBD superar o IED não é indício de debilidade presente ou futura do balanço de pagamentos do Brasil. “O Investimento Brasileiro Direto ajuda a reduzir o deficit (ou a aumentar o superavit) da conta-corrente. Quanto mais investimentos brasileiros diretos no exterior, maior o volume de lucros remetidos do exterior para o país. Ou seja, o IBD é um fator que gera entrada de recursos na conta corrente, uma vez que os lucros compõem uma das contas de transações correntes”, explica ao Correio um membro da equipe econômica.
Apetite voraz
A internacionalização das empresas brasileiras também tem reflexos na estratégia das instituições financeiras do país. Vice-presidente de Negócios Internacionais do Banco do Brasil, Alan Toledo espera que, até o fim do ano, tenha se concretizado a intenção do BB de ir às compras nos EUA. “Há 1,4 milhão de brasileiros vivendo no país. Estamos buscando oportunidades na Flórida e em Nova York e não descartamos a possibilidade de fazermos mais de uma aquisição, embora duas instituições impliquem integração tecnológica”, adianta.
A instituição, que já adquiriu o Banco da Patagônia, na Argentina, mira oportunidades ainda no Chile, na Colômbia, no Equador e no Peru. “Nesses países, há um aumento das participações de empresas brasileiras em negócios como veículos, petróleo e construção. Queremos definir a nossa participação em um deles”, diz Toledo. Hoje, os negócios do BB no exterior correspondem a 1% do resultado do banco. A previsão da instituição é que, em nove anos, essa proporção se eleve a 9%.
Desenvolvidos
O apetite comprador brasileiro já chama a atenção de nações desenvolvidas. Países tradicionalmente investidores, como França e Holanda, abriram agências no Brasil que visam a captação de recursos. “Estou muito impressionado com a capacidade de as empresas brasileiras se projetarem no exterior. O investimento do Brasil fora do país cresceu muito. Temos hoje 30 empresas do Brasil na França e, ao abrirmos a agência no país, queremos dizer aos brasileiros que a França os espera”, diz o embaixador e presidente da Agência Francesa de Investimentos Internacionais, David Appia.
“Os brasileiros estão se expandindo pelo mundo. Queremos levar esses investimentos para a Holanda”, afirma o diretor da Agência Neerlandesa de Investimentos Estrangeiros, Odécio Roland. Para ele, os recursos poderão ajudar a impulsionar a economia holandesa. “A crise não é o principal motivo por que resolvemos instalar a agência no Brasil. Mas a atração de investimentos ajuda a nossa economia e o Brasil é um dos grandes países emergentes com potencial investidor.