\”Na hipótese, o Empréstimo Compulsório sobre energia elétrica, exigido dos estabelecimentos industriais com consumo superior a 2.000 Kwh foi instituído pelas Leis nºs 4.156/62 e 5.073/66 e regulamentada pelo Decreto-Lei nº 644/69. Sob a égide da Emenda Constitucional nº 1/69 foram editadas a LC nº 13/72, as Leis nºs 5.824/72, 6.180/74 e 7.181/83, bem como o Decreto-Lei nº 1.512/76 que o regulamentava.\”
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE 1º INSTÂNCIA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL
PRIMEIRA VARA – PROCESSO Nº 2004.34.00.006507-2
SENTENÇA
Armando Favato e Santa Ignez Construções, Industrias e Comércio Ltda propuseram a presente Ação de Cobrança em face de Centrais Elétricas Brasileiras S/A – ELETROBRÁS e União (Fazenda Nacional), objetivando \”a condenação das Rés ao pagamento do débito, acrescido de juros e correção monetária, até a data do efetivo pagamento…\”
OS Autores afirmaram que possuem, em co-propriedade, títulos emitidos em 1977, pela Eletrobrás – Obrigações ao Portador, os quais advieram da cobrança de empréstimo compulsório, na forma autorizada na Lei nº 4.156 de 28.11.1962.
Narraram que, de acordo com o estabelecido no verso dos próprios títulos, a dívida deve ser paga com as devidas taxas de juros e correção monetária. Todavia, embora as obrigações já tenham vencido, ainda não foram quitadas na forma devida.
Destacaram que a prescrição da presente ação (a qual foi proposta no intuito de obter a restituição do empréstimo compulsório incidente sobre energia elétrica) só ocorrerá em 2017.
Explicaram que ao ingressar com a presente ação, juntaram cópias autenticadas das cártulas. Por fim, vindicaram ad cautelam, o depósito judicial dos títulos originais, objeto de cobrança.
À fl. 126, foi deferido o pleito de prioridade de execução de todos os atos processais relativos a este feito, nos termos da Lei nº 10.173/2001.
Devidamente citadas, as Rés apresentaram contestações. A União (Fazenda Nacional – fls. 143/157) argüiu preliminarmente: 1) a sua ilegitimidade passiva ad causam, com a conseqüente extinção do feito, sem julgamento do mérito (CPC, art. 267, VI) e 2) falta de comprovação do direito alegado. Suscitou a prescrição qüinqüenal, como prejudicial de mérito. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido.
Por sua vez a segunda Ré (Centrais Elétricas Brasileiras S/A – Eletrobrás – fls. 159/178) suscitou a decadência dos direitos alegados (resgate das Obrigações de que são portadores), sob argumento de que estavam assegurados e aptos a serem exercidos no prazo de 05 anos após o vencimento dos títulos. Por conseguinte, pugnou pela extinção do processo, com julgamento do mérito (CPC, art 269, IV). Todavia, caso haja entendimento diverso, pediu pela improcedência dos pedidos. Juntou documentos aos autos (fls. 179/196).
Réplicas as fls. 198/205.
Facultada a especificação de provas, as partes postularam o julgamento antecipado da lide (fls. 211/213/224 e 227).
É O RELATÓRIO
Inicialmente, rejeita-se a sustentada carência de ação em face da ilegitimidade passiva da União, porquanto a própria legislação de regência faz ressair induvidosa a sua legitimação para a lide. (STJ, Resp. nº 39.919, Rel Min Ari Pargendler. DJ 18.11.96: TRF 1º Região; AC nº 1991.01.041177-DF Rel. Des. Fed Cândido Ribeiro, DJ 12.6.98 e AC nº 1997.34.00.003580-2/DF, Rel. Des. Fed. Plauto Ribeiro, DJ 22.11.02).
Não merece prosperar também a alegada ausência de comprovação do direito invocado, eis que as Rés não negam os fatos deduzidos pelos Autores. Ao contrário, defendem a conduta adotada pela Eletrobrás. Ademais, além dos Autores juntarem cópias dos títulos objeto de cobrança (fls. 32 e verso; 71 e verso), os quais demonstram o recolhimento do ECE que pretendem repetir, a jurisprudência entende que essa comprovação pode e deve ser feita quando de eventual execução.
Não merecem guarida as prejudiciais de mérito suscitadas (prescrição e decadência). No que respeita à prescrição, cabe frisar de inicio que e de 20 (vinte) anos o prazo para o resgate do empréstimo compulsório, nos termos do art. 2º do Decreto-Lei nº 1.512/76. Assim, inicia-se o prazo prescricional para a reclamação dos valores, incluindo os consectários, após o vencimento do prazo para o resgate. Isso quer dizer que, superado o termo a quo para restituição, inicia-se o prazo de 20 (vinte) anos para o contribuinte proceder à cobrança do que entende devido. Tal inteligência é obtida, também de reiterados julgados do Superior Tribunal de Justiça.
Com esses fundamentos, rejeito as preliminares suscitadas.
No mérito, a natureza tributária do empréstimo compulsório é pacífica (art. 3º, CTN), sendo uma exação restituível aos contribuintes (no caso, criado para atender investimento públicos de caráter urgente e de relevante interesse social art. 148, CF).
Na hipótese, o Empréstimo Compulsório sobre energia elétrica, exigido dos estabelecimentos industriais com consumo superior a 2.000 Kwh foi instituído pelas Leis nºs 4.156/62 e 5.073/66 e regulamentada pelo Decreto-Lei nº 644/69. Sob a égide da Emenda Constitucional nº 1/69 foram editadas a LC nº 13/72, as Leis nºs 5.824/72, 6.180/74 e 7.181/83, bem como o Decreto-Lei nº 1.512/76 que o regulamentava.
Nada obstante, a legislação de regência desse tributo foi recepcionada pela nova ordem constitucional que, no parágrafo 12, do art 34, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, ressalvou que a urgência prevista no art 148, II, não prejudicaria \”a cobrança do empréstimo compulsório instituído, em benefício das Centrais Elétricas Brasileiras S/A (Eletrobrás), pela lei nº 4.156 de 28/11/62, com alterações posteriores\”, consoante decidiu o STF (RE 146615/PE, Rel. Min. Mauricio Correa, DJ de 30/06/1995).
Desse modo, estreme de qualquer vício a instituição do tributo ora guerreado.
Resta, pois, discutir os critérios de correção de tais valores na forma em que devolvidos pelo ente público.
Como relatado, buscam os Autores a condenação das Rés a restituir-lhes os valores recolhidos a título de empréstimo compulsório de energia elétrica (Lei nº4.156/62), acrescidos de juros e correção monetária até data do efetivo pagamento.
Quanto à atualização dos indébitos repetidos em ações da empresa, é certo ter a Eletrobrás sempre desprezada os índices inflacionários do período anterior à sua constituição, corrigindo-os somente a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao do recolhimento, nos termos do art. 2º, do Decreto-Lei nº 1.512/76, verbis:
Art. 2º O montante das contribuições de cada consumidor industrial, apurado sobre o consumo de energia elétrica verificado em cada exercício, constituirá, em primeiro de janeiro o ano seguinte, o seu crédito a títulos de empréstimo compulsório que será resgatado no prazo de 20 (vinte) anos e vencerá juros de 6% (seis por cento ao ano). (grifamos)
Em que pesem as respeitáveis manifestações em favor da tese da Eletrobrás, parece-me inadmissível qualquer interpretação do dispositivo acima que possa levar ao entendimento de que os valores arrecadados, a título de empréstimo compulsório, não devam ser corrigidos desde a data em que recolhidos pelo contribuinte.
Qualquer outra interpretação acabará por repercutir em enriquecimento ilícito das rés, em flagrante prejuízo para os contribuintes que foram obrigados a recolher tal exação.
Ademais, é vedada pela C.F. a utilização de tributo para fins de confisco (art 150, IV), no que restará caracterizado o empréstimo compulsório sobre energia elétrica, acaso desprezado o período de inflação anterior à escrituração contábil dos créditos.
Sobre o tema, destacam-se os seguintes julgados, verbis:
TRIBUTÁRIO, EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE ENERGIA ELÉTRICA, CORREÇÃO MONETÁRIA.
1 – A conjugação entre o art 2º do DL 1.512/76 e o art 3º da Lei 4.357/64 disciplina o tratamento contábil reservado aos valores recolhidos pelos consumidores de energia elétrica, a título de empréstimo compulsório. Em homenagem à vedação do confisco velado (CF, art. 150, IV), tais valores antes de se inscreverem na rubrica crédito, devem ser corrigidos monetariamente. Não é licito ao Estado colocar os créditos do contribuinte ao largo do tempo e da inflação, como se um e outra não existissem. (Resp. 194.952/SC Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, in DJU 29/11/99)
2 – Constituindo a correção monetária em um minus, e não um plus, para assegurar o valor da moeda, deve a atualização corresponder ao índice que melhor reflita a realidade, ou seja, o IPC.
3 – Recurso provido (RESP. nº 2000.786/SC. Rel Min. Milton Luiz Pereira. DJ de 08.10.01) (grifamos)
TRIBUTÁRIO, EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO – CORREÇÃO MONETÁRIA – TERMO INICIAL – LEI Nº 4.357/64, ART 3º – DL 1.512/76 ART 2º
1 – Na interpretação da lei tributária, não se pode fazer tabula rasa da vedação constitucional ao confisco velado (CF, art. 150, IV).
2 – Negar correção monetária aos valores arrecadados a título de empréstimo compulsório é utilizar a lei tributária como instrumento de confisco, em desafio à vedação constitucional.
3 – A conjugação entre o art. 2º do DL 1.512/76 e o art. 3º da lei 4.357/64 disciplina o tratamento contábil reservado aos valores recolhidos pelos consumidores de energia elétrica, a título de empréstimo compulsório. Em homenagem à vedação do confisco velado (CF. Art. 150, IV), tais valores antes de se inscreverem na rubrica crédito, devem ser corrigidos monetariamente. Não é licito ao Estado colocar os créditos do contribuinte ao largo do tempo e da inflação, como se um e outra não existissem. (Resp. nº 194.952/SC. Rel. MIn. Humberto Gomes de Barros. DJ de 29/11/99)(grifamos)
Seguindo tal entendimento, tendo em conta os princípios que vedam o enriquecimento sem causa e a utilização do tributo com efeito confiscatório, é forçoso concluir que não se pode desprezar os índices inflacionários expurgados pelos sucessivos planos econômicos.
De sorte que \”a correção monetária há de ser plena, eis que nada acrescenta ao capital, não constituindo um plus, mas, tão-somente, a reposição do valor real moeda\” (TRF 1º Região. AC 2002.34.00.0046298/DF, 4º Turma. Rel Des. Fed. Hilton Queiroz, DJ de 18/06/2003).
Dessa forma, os valores arrecadados, a título de empréstimo compulsório sobre energia elétrica, devem ser corrigidos da seguinte forma: 1) IPC, até janeiro de 1991;2) INPC, de fevereiro de 1991 a dezembro de 1991; 3) UFIR, de janeiro de 1992 a dezembro de 1995; 4) SELIC, a partir de janeiro de 1996.
Nos meses de janeiro de 1989 e abril de 1990, devem ser considerados os índices de 42,72% e 44,80%, respectivamente, nos termos do julgado proferido na AC nº 1997.34.00.003580-2/DF, 3º Turma da TRF 1º Região. Rel. Des. Fed. Plauto Ribeiro. DJ 22/11/2002.
Estabelecidas tais premissas, os autores têm o direito de receber a restituição dos valores pagos a título de empréstimo compulsório, cujo prazo de devolução já tenha se verificado, devidamente corrigidos (correção desde o pagamento e inclusão de expurgos inflacionários).
Não se pode olvidar, ainda, que as diferenças apuradas em razão dos parâmetros já definidos nessa sentença repercutirão sobre os juros de 6%, devidos aos contribuintes anualmente, nos termos do art 2º, parágrafo único, da Lei nº 5.073/66, e no art. 2º do DL nº 1.512/76.
Ante o exposto, julgo procedente o pedido, para condenar as rés à obrigações de fazer, no sentido de proceder à restituição dos valores recolhidos a títulos de empréstimo compulsório sobre energia elétrica, pelas autoras, cujo prazo de devolução tenha se verificado, corrigindo-os monetariamente, desde, a data de cada recolhimento verificado a partir de janeiro de 1977, até a sua efetiva restituição (resgate ou conversão em ações), utilizando-se, para tanto, o IPC, até janeiro de 1991 (nos meses de janeiro de 1989 e abril de 1990, devem ser considerados os índices de 42,72% e 44,80% respectivamente); o INPC, de fevereiro de 1991 a dezembro de 1991; a UFIR, de janeiro de 1992 a dezembro de 1995; e a SELIC, a partir de janeiro de 1996, tudo acrescido de juros moratórios de 0,5% ao mês, a partir da citação.
Condeno as rés ressarcimento das custas e honorários advocatícios que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais) per capita.
Sentença sujeita ao reexame necessário. Processados os recursos eventualmente interpostos, remetem-se os autos ao eg. TRF da 1º Região.
Publique-se, registre-se e intime-se
Brasília, 22 de Abril de 2005.
FRANCISCO RENATO CODEVILA PINHEIRO FILHO
Juiz Federal Substituto da 6º Vara/SJDF; em exercício na 1º Vara/SJDF
\”Na hipótese, o Empréstimo Compulsório sobre energia elétrica, exigido dos estabelecimentos industriais com consumo superior a 2.000 Kwh foi instituído pelas Leis nºs 4.156/62 e 5.073/66 e regulamentada pelo Decreto-Lei nº 644/69. Sob a égide da Emenda Constitucional nº 1/69 foram editadas a LC nº 13/72, as Leis nºs 5.824/72, 6.180/74 e 7.181/83, bem como o Decreto-Lei nº 1.512/76 que o regulamentava.\”
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE 1º INSTÂNCIA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL
PRIMEIRA VARA – PROCESSO Nº 2004.34.00.006507-2
SENTENÇA
Armando Favato e Santa Ignez Construções, Industrias e Comércio Ltda propuseram a presente Ação de Cobrança em face de Centrais Elétricas Brasileiras S/A – ELETROBRÁS e União (Fazenda Nacional), objetivando \”a condenação das Rés ao pagamento do débito, acrescido de juros e correção monetária, até a data do efetivo pagamento…\”
OS Autores afirmaram que possuem, em co-propriedade, títulos emitidos em 1977, pela Eletrobrás – Obrigações ao Portador, os quais advieram da cobrança de empréstimo compulsório, na forma autorizada na Lei nº 4.156 de 28.11.1962.
Narraram que, de acordo com o estabelecido no verso dos próprios títulos, a dívida deve ser paga com as devidas taxas de juros e correção monetária. Todavia, embora as obrigações já tenham vencido, ainda não foram quitadas na forma devida.
Destacaram que a prescrição da presente ação (a qual foi proposta no intuito de obter a restituição do empréstimo compulsório incidente sobre energia elétrica) só ocorrerá em 2017.
Explicaram que ao ingressar com a presente ação, juntaram cópias autenticadas das cártulas. Por fim, vindicaram ad cautelam, o depósito judicial dos títulos originais, objeto de cobrança.
À fl. 126, foi deferido o pleito de prioridade de execução de todos os atos processais relativos a este feito, nos termos da Lei nº 10.173/2001.
Devidamente citadas, as Rés apresentaram contestações. A União (Fazenda Nacional – fls. 143/157) argüiu preliminarmente: 1) a sua ilegitimidade passiva ad causam, com a conseqüente extinção do feito, sem julgamento do mérito (CPC, art. 267, VI) e 2) falta de comprovação do direito alegado. Suscitou a prescrição qüinqüenal, como prejudicial de mérito. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido.
Por sua vez a segunda Ré (Centrais Elétricas Brasileiras S/A – Eletrobrás – fls. 159/178) suscitou a decadência dos direitos alegados (resgate das Obrigações de que são portadores), sob argumento de que estavam assegurados e aptos a serem exercidos no prazo de 05 anos após o vencimento dos títulos. Por conseguinte, pugnou pela extinção do processo, com julgamento do mérito (CPC, art 269, IV). Todavia, caso haja entendimento diverso, pediu pela improcedência dos pedidos. Juntou documentos aos autos (fls. 179/196).
Réplicas as fls. 198/205.
Facultada a especificação de provas, as partes postularam o julgamento antecipado da lide (fls. 211/213/224 e 227).
É O RELATÓRIO
Inicialmente, rejeita-se a sustentada carência de ação em face da ilegitimidade passiva da União, porquanto a própria legislação de regência faz ressair induvidosa a sua legitimação para a lide. (STJ, Resp. nº 39.919, Rel Min Ari Pargendler. DJ 18.11.96: TRF 1º Região; AC nº 1991.01.041177-DF Rel. Des. Fed Cândido Ribeiro, DJ 12.6.98 e AC nº 1997.34.00.003580-2/DF, Rel. Des. Fed. Plauto Ribeiro, DJ 22.11.02).
Não merece prosperar também a alegada ausência de comprovação do direito invocado, eis que as Rés não negam os fatos deduzidos pelos Autores. Ao contrário, defendem a conduta adotada pela Eletrobrás. Ademais, além dos Autores juntarem cópias dos títulos objeto de cobrança (fls. 32 e verso; 71 e verso), os quais demonstram o recolhimento do ECE que pretendem repetir, a jurisprudência entende que essa comprovação pode e deve ser feita quando de eventual execução.
Não merecem guarida as prejudiciais de mérito suscitadas (prescrição e decadência). No que respeita à prescrição, cabe frisar de inicio que e de 20 (vinte) anos o prazo para o resgate do empréstimo compulsório, nos termos do art. 2º do Decreto-Lei nº 1.512/76. Assim, inicia-se o prazo prescricional para a reclamação dos valores, incluindo os consectários, após o vencimento do prazo para o resgate. Isso quer dizer que, superado o termo a quo para restituição, inicia-se o prazo de 20 (vinte) anos para o contribuinte proceder à cobrança do que entende devido. Tal inteligência é obtida, também de reiterados julgados do Superior Tribunal de Justiça.
Com esses fundamentos, rejeito as preliminares suscitadas.
No mérito, a natureza tributária do empréstimo compulsório é pacífica (art. 3º, CTN), sendo uma exação restituível aos contribuintes (no caso, criado para atender investimento públicos de caráter urgente e de relevante interesse social art. 148, CF).
Na hipótese, o Empréstimo Compulsório sobre energia elétrica, exigido dos estabelecimentos industriais com consumo superior a 2.000 Kwh foi instituído pelas Leis nºs 4.156/62 e 5.073/66 e regulamentada pelo Decreto-Lei nº 644/69. Sob a égide da Emenda Constitucional nº 1/69 foram editadas a LC nº 13/72, as Leis nºs 5.824/72, 6.180/74 e 7.181/83, bem como o Decreto-Lei nº 1.512/76 que o regulamentava.
Nada obstante, a legislação de regência desse tributo foi recepcionada pela nova ordem constitucional que, no parágrafo 12, do art 34, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, ressalvou que a urgência prevista no art 148, II, não prejudicaria \”a cobrança do empréstimo compulsório instituído, em benefício das Centrais Elétricas Brasileiras S/A (Eletrobrás), pela lei nº 4.156 de 28/11/62, com alterações posteriores\”, consoante decidiu o STF (RE 146615/PE, Rel. Min. Mauricio Correa, DJ de 30/06/1995).
Desse modo, estreme de qualquer vício a instituição do tributo ora guerreado.
Resta, pois, discutir os critérios de correção de tais valores na forma em que devolvidos pelo ente público.
Como relatado, buscam os Autores a condenação das Rés a restituir-lhes os valores recolhidos a título de empréstimo compulsório de energia elétrica (Lei nº4.156/62), acrescidos de juros e correção monetária até data do efetivo pagamento.
Quanto à atualização dos indébitos repetidos em ações da empresa, é certo ter a Eletrobrás sempre desprezada os índices inflacionários do período anterior à sua constituição, corrigindo-os somente a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao do recolhimento, nos termos do art. 2º, do Decreto-Lei nº 1.512/76, verbis:
Art. 2º O montante das contribuições de cada consumidor industrial, apurado sobre o consumo de energia elétrica verificado em cada exercício, constituirá, em primeiro de janeiro o ano seguinte, o seu crédito a títulos de empréstimo compulsório que será resgatado no prazo de 20 (vinte) anos e vencerá juros de 6% (seis por cento ao ano). (grifamos)
Em que pesem as respeitáveis manifestações em favor da tese da Eletrobrás, parece-me inadmissível qualquer interpretação do dispositivo acima que possa levar ao entendimento de que os valores arrecadados, a título de empréstimo compulsório, não devam ser corrigidos desde a data em que recolhidos pelo contribuinte.
Qualquer outra interpretação acabará por repercutir em enriquecimento ilícito das rés, em flagrante prejuízo para os contribuintes que foram obrigados a recolher tal exação.
Ademais, é vedada pela C.F. a utilização de tributo para fins de confisco (art 150, IV), no que restará caracterizado o empréstimo compulsório sobre energia elétrica, acaso desprezado o período de inflação anterior à escrituração contábil dos créditos.
Sobre o tema, destacam-se os seguintes julgados, verbis:
TRIBUTÁRIO, EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO SOBRE ENERGIA ELÉTRICA, CORREÇÃO MONETÁRIA.
1 – A conjugação entre o art 2º do DL 1.512/76 e o art 3º da Lei 4.357/64 disciplina o tratamento contábil reservado aos valores recolhidos pelos consumidores de energia elétrica, a título de empréstimo compulsório. Em homenagem à vedação do confisco velado (CF, art. 150, IV), tais valores antes de se inscreverem na rubrica crédito, devem ser corrigidos monetariamente. Não é licito ao Estado colocar os créditos do contribuinte ao largo do tempo e da inflação, como se um e outra não existissem. (Resp. 194.952/SC Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, in DJU 29/11/99)
2 – Constituindo a correção monetária em um minus, e não um plus, para assegurar o valor da moeda, deve a atualização corresponder ao índice que melhor reflita a realidade, ou seja, o IPC.
3 – Recurso provido (RESP. nº 2000.786/SC. Rel Min. Milton Luiz Pereira. DJ de 08.10.01) (grifamos)
TRIBUTÁRIO, EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO – CORREÇÃO MONETÁRIA – TERMO INICIAL – LEI Nº 4.357/64, ART 3º – DL 1.512/76 ART 2º
1 – Na interpretação da lei tributária, não se pode fazer tabula rasa da vedação constitucional ao confisco velado (CF, art. 150, IV).
2 – Negar correção monetária aos valores arrecadados a título de empréstimo compulsório é utilizar a lei tributária como instrumento de confisco, em desafio à vedação constitucional.
3 – A conjugação entre o art. 2º do DL 1.512/76 e o art. 3º da lei 4.357/64 disciplina o tratamento contábil reservado aos valores recolhidos pelos consumidores de energia elétrica, a título de empréstimo compulsório. Em homenagem à vedação do confisco velado (CF. Art. 150, IV), tais valores antes de se inscreverem na rubrica crédito, devem ser corrigidos monetariamente. Não é licito ao Estado colocar os créditos do contribuinte ao largo do tempo e da inflação, como se um e outra não existissem. (Resp. nº 194.952/SC. Rel. MIn. Humberto Gomes de Barros. DJ de 29/11/99)(grifamos)
Seguindo tal entendimento, tendo em conta os princípios que vedam o enriquecimento sem causa e a utilização do tributo com efeito confiscatório, é forçoso concluir que não se pode desprezar os índices inflacionários expurgados pelos sucessivos planos econômicos.
De sorte que \”a correção monetária há de ser plena, eis que nada acrescenta ao capital, não constituindo um plus, mas, tão-somente, a reposição do valor real moeda\” (TRF 1º Região. AC 2002.34.00.0046298/DF, 4º Turma. Rel Des. Fed. Hilton Queiroz, DJ de 18/06/2003).
Dessa forma, os valores arrecadados, a título de empréstimo compulsório sobre energia elétrica, devem ser corrigidos da seguinte forma: 1) IPC, até janeiro de 1991;2) INPC, de fevereiro de 1991 a dezembro de 1991; 3) UFIR, de janeiro de 1992 a dezembro de 1995; 4) SELIC, a partir de janeiro de 1996.
Nos meses de janeiro de 1989 e abril de 1990, devem ser considerados os índices de 42,72% e 44,80%, respectivamente, nos termos do julgado proferido na AC nº 1997.34.00.003580-2/DF, 3º Turma da TRF 1º Região. Rel. Des. Fed. Plauto Ribeiro. DJ 22/11/2002.
Estabelecidas tais premissas, os autores têm o direito de receber a restituição dos valores pagos a título de empréstimo compulsório, cujo prazo de devolução já tenha se verificado, devidamente corrigidos (correção desde o pagamento e inclusão de expurgos inflacionários).
Não se pode olvidar, ainda, que as diferenças apuradas em razão dos parâmetros já definidos nessa sentença repercutirão sobre os juros de 6%, devidos aos contribuintes anualmente, nos termos do art 2º, parágrafo único, da Lei nº 5.073/66, e no art. 2º do DL nº 1.512/76.
Ante o exposto, julgo procedente o pedido, para condenar as rés à obrigações de fazer, no sentido de proceder à restituição dos valores recolhidos a títulos de empréstimo compulsório sobre energia elétrica, pelas autoras, cujo prazo de devolução tenha se verificado, corrigindo-os monetariamente, desde, a data de cada recolhimento verificado a partir de janeiro de 1977, até a sua efetiva restituição (resgate ou conversão em ações), utilizando-se, para tanto, o IPC, até janeiro de 1991 (nos meses de janeiro de 1989 e abril de 1990, devem ser considerados os índices de 42,72% e 44,80% respectivamente); o INPC, de fevereiro de 1991 a dezembro de 1991; a UFIR, de janeiro de 1992 a dezembro de 1995; e a SELIC, a partir de janeiro de 1996, tudo acrescido de juros moratórios de 0,5% ao mês, a partir da citação.
Condeno as rés ressarcimento das custas e honorários advocatícios que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais) per capita.
Sentença sujeita ao reexame necessário. Processados os recursos eventualmente interpostos, remetem-se os autos ao eg. TRF da 1º Região.
Publique-se, registre-se e intime-se
Brasília, 22 de Abril de 2005.
FRANCISCO RENATO CODEVILA PINHEIRO FILHO
Juiz Federal Substituto da 6º Vara/SJDF; em exercício na 1º Vara/SJDF