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28 de fevereiro de 2024Hodiernamente, diante da sanha arrecadatória do governo federal, temos verificado inúmeras alterações legislativas que refletem diretamente nas empresas, bem como nos feitos executivos fiscais.
Assim, destacamos a alteração no Código Tributário Nacional no sentido de permitir o bloqueio e a indisponibilidade dos bens do devedor, conforme Lei nº 118/2005. Tal inovação na regra jurídica prevendo que, “na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial”.
Na prática a nova regra permite, entre outras coisas, que a Fazenda Pública possa obter judicialmente o bloqueio de recursos financeiros depositados em contas bancárias de contribuintes que possuem execução fiscal. Não obstante, invariavelmente, a Fazenda Federal tem requerido diretamente a penhora on-line sem realizar todas as medidas cabíveis no intuito de encontrar bens das empresas, ou seja, o que seria exceção vem se transformando em prática comum, quase uma regra geral utilizada pelos exequentes, com a anuência quase que parcial dos juízes, como instrumento de coerção do devedor.
No entanto, nesta seara tributária, vem se destacando o Escritório Édison Freitas de Siqueira, eis que em recente decisão proferida pela 6º Turma do Tribunal Regional Federal da 3º Região reverteu a determinação do bloqueio de contas da empresa OURO FINO INDÚSTRIA DE PLÁSTICOS REFORÇADOS LTDA, no Agravo de instrumento nº 2008.03.00.024839-0, senão vejamos o voto “ipsis literis”:
“Em princípio, verifico que a r. decisão agravada reporta-se à manifestação da exeqüente, cujo teor requer o prosseguimento da execução com a penhora “on-line” (Sistema BACEN-JUD) dos ativos financeiros, bem como das contas de previdência complementar eventualmente encontrados em nome da Executada… (fls. 61); logo não há que se falar em nulidade do decisum por ausência de fundamentação, nos termos do art. 93,IX da CF e art. 165 do CPC.
Passo à análise do mérito.
Assiste razão à agravante.
Trata-se de agravo de instrumento, contra a r. decisão que, em execução fiscal, acolhendo pleito da exeqüente, determinou a utilização do Sistema BACENJUD, com o intuito de rastrear e bloquear ativos financeiros do devedor.
É certo que, conjugado ao princípio da menor onerosidade (art. 620 do CPC), vigora também o princípio de que a execução se realiza no interesse do credor (art. 612 do CPC).
A Constituição Federal protege a intimidade, a privacidade, a honra e a imagem das pessoas, e consequentemente, nesse aspecto, abrange a garantia à inviolabilidade do sigilo de dados (CF, art. 5º, X e XII).
Entretanto, há que se considerar que os direitos e garantias individuais, inclusive aqueles referentes à intimidade e à privacidade, não se revestem de caráter absoluto, cedendo em razão do interesse público, ou até mesmo diante de conflitos entre as próprias liberdades públicas, merecendo cuidadosa interpretação, de forma a coordenar e harmonizar os princípios, evitando o sacrifício total de uns em relação aos outros (princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas).
O acesso às informações e documentos complementares somente é permitido na hipótese de serem detectados indícios de falhas, incorreções ou omissões, ou de cometimento de ilícito fiscal, ficando o agente tributário obrigado a guardar segredo das informações e dados obtidos, norma já consagrada pelo art. 198, do CTN, verbis :
Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.
§ 1º. Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes :
I – requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça;
(…)
§ 3º. Não é vedada a divulgação de informações relativas a :
(…)
II – Inscrições na Dívida Ativa da Fazenda Pública;
(…)
De outra parte, dispõe o art. 185-A, do Código Tributário Nacional, introduzido pela Lei Complementar nº 118, de 09 de fevereiro de 2005, que:
Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial. (grifei)
Em 08 de maio de 2001, foi firmado convênio de cooperação técnico-institucional entre o Banco Central do Brasil, o Superior Tribunal de Justiça e o Conselho da Justiça Federal para fins de acesso, via Internet, ao Sistema Bacenjud, através do qual o STJ, o CJF e os Tribunais signatários de Termo de Adesão poderão, dentro de suas áreas de competência, encaminhar às instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo BACEN, solicitações de informações sobre a existência de contas correntes e aplicações financeiras, determinações de bloqueio e desbloqueio de contas e comunicações de decretação e extinção de falências envolvendo pessoas físicas e jurídicas clientes do Sistema Financeiro Nacional, bem como outras solicitações que vierem a ser definidas pelas partes (cláusula primeira, parágrafo único de citado convênio).
E, mais recentemente, entrou em vigor o art. 655-A, do CPC, inserido pela Lei nº 11.382/06, de aplicação subsidiária à Lei nº 6.830/80, que dispõe sobre a penhora de dinheiro, depósito ou aplicação financeira a ser realizado pelo juiz, preferencialmente por meio eletrônico, a requerimento da exeqüente.
Entretanto, o pleito de penhora on-line, por se tratar de medida excepcional, deverá ser analisado com cautela, devendo ser autorizado somente quando houver comprovação de que a exequente esgotou todos os meios à sua disposição para localizar o devedor e bens de sua propriedade, passíveis de penhora, de modo a garantir o juízo e possibilitar o prosseguimento da execução fiscal.
Dessa forma, presentes os requisitos, nada obsta a utilização do sistema Bacenjud, não havendo falar-se que tal deferimento constitui violação aos arts. 5º, XIII e 170, da CF, bem como as Súmulas 70, 323 e 547, do STF.
Entretanto, no caso sub judice, não há como manter o bloqueio dos ativos financeiros da agravante, tal como determinado pelo d. magistrado de origem, uma vez que a agravada limitou-se a requerer o bloqueio dos valores depositados em contas bancárias de titularidade da executada, nos termos do art. 185-A, do CTN, sem, contudo, realizar todas diligências no sentido de localizar bens do devedor, aptos a garantir o juízo.
Em hipóteses semelhantes, trago à colação precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – REQUERIMENTO PARA EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO A BANCOS SOLICITANDO COMUNICAÇÃO AO JUÍZO SOBRE EXISTÊNCIA DE APLICAÇÕES FINANCEIRAS E ATIVOS IMOBILIÁRIOS EM NOME DA EXECUTADA E DOS SEUS SÓCIOS – INDEFERIMENTO MANTIDO EM SEDE DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO ESPECIAL – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO EM RELAÇÃO À VIOLAÇÃO DE LEI FEDERAL – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL COMPROVADO – QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO – AUTORIZAÇÃO JUDICIAL – EXCEPCIONALIDADE – POSSIBILIDADE.
I-Na esteira da iterativa jurisprudência deste STJ, em regra geral, o sigilo bancário só pode ser quebrado com autorização judicial.
II-Em situação excepcional, também com a intervenção judicial, esgotados os meios à disposição da credora para efetivação da penhora e prosseguimento da execução fiscal, predominando o interesse público, é admissível a solicitação de informações aos Bancos sobre eventuais aplicações financeiras e ativos imobiliários em nome da executada e dos seus sócios responsáveis pelo débito para com a Fazenda Pública.
III-Recurso provido.
(STJ, RESP nº 332.282-RJ, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ 18/02/2002). PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO FISCAL. SIGILO BANCÁRIO.
1. A quebra do sigilo bancário em execução fiscal pressupõe que a Fazenda credora tenha esgotado todos os meios de obtenção de informações sobre a existência de bens do devedor e que as diligências restaram infrutíferas, porquanto é assente na Corte que o juiz da execução fiscal só deve deferir pedido de expedição de ofício à Receita Federal e ao BACEN após o exeqüente comprovar não ter logrado êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado e seus bens.
2. Precedentes: RESP 282.717/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 11/12/2000; RESP 206.963/ES, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 28/06/1999, RESP 204.329/MG, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 19/06/2000, RESP 251.121/SP, Min. Nancy Andrighi, DJ de 26.03.2001.
(…)
(STJ, 1ª Turma, AgRg no Recurso Especial nº 664.522, Rel. Min. Luiz Fux, v.u., 13/02/06)
Igual posicionamento tem sido adotado por esta E. Sexta Turma: AG n° 2005.03.00.064304-6, Rel. Des. Fed. Lazarano Neto, j. 03/05/2006, DJ 03/07/2006.
Em face de todo o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento.”
Por fim, faz-se necessário uma análise mais ampla a respeito da aplicabilidade da penhor on-line nos feitos executivos, eis que se trata de medida excepcional. No entanto, percebe-se que, ardilosamente, tal medida tem sido requerida pela Fazenda Federal sem as devidas diligências com o fito de dar celeridade nas cobranças das execuções fiscais. Contudo, temos que a penhora on-line é um instrumento utilizado como meio de coerção indireta em substituição ao princípio constitucional do devido processo legal inserto no art. 5º, LIV da CF.
Marlon Daniel Real
Subgerente
Núcleo II
Edison Freitas de Siqueira Advogados Associados