A necessidade dos pacotes de estímulos econômico vai levar os governos dos Estados Unidos e da Europa a pegar empréstimos muito mais altos no mercados, com as emissões podendo superar US$ 3 trilhões este ano. Alem disso, é prevista emissão de US$ 1 trilhão de bônus de bancos garantidos pelos governos americano e europeus.
Por sua vez, as companhias americanas e europeias têm também mais de US$ 1,8 trilhão de dívidas para rolar este ano, o que ilustra a que ponto o mercado estará apertado para títulos das economias emergentes.
Os dados são do Institute of International Finance (IIF), associação dos maiores bancos comerciais do mundo, em documento ao qual o Valor teve acesso. Nota que os papéis dos governos do G-10 (economias mais desenvolvidas) e de bancos garantidos por eles têm sido favorecidos pela aversão a risco de investidores.
A enxurrada de endividamento dos governos de países desenvolvidos está se tornando um desafio em meio à crise global. O Estado voltou a ter um papel central na economia, mas deverá se endividar tão maciçamente que não se sabe no que esses bilhões de dólares vão resultar.
Enquanto o IIF prevê emissões pouco acima de US$ 1,1 trilhão pelo governo dos Estados Unidos, o professor Niall Ferguson, de Harvard, estima que as emissões podem chegar ao dobro. E que só há dois meios de fazer esse volume de captação: deslocando os outros ou imprimindo dólares. E não há jeito de pegar emprestado US$ 2,2 trilhões sem influenciar as taxas de juros ou inflação no longo prazo, conforme disse ao jornal \”International Herad Tribune\” (IHT).
Para o presidente do Banco Central do México, Guillermo Ortiz, o impacto e evidente: \”Haverá uma limitação muito forte no fluxo de capital para os emergentes, e isso depois da saída muito importante de recursos que já ocorreu\”, declarou Ortiz ao Valor.
Autoridades monetárias reconhecem que o objetivo é salvar os bancos e reativar a maior economia do planeta. Mas não escondem a inquietação com o nível de endividamento dos desenvolvidos deflagrar a volta da inflação e altas de juros em torno do mundo no futuro.
Em Davos, na Suíça, durante o Fórum Mundial de Economia, o presidente do Banco Central do Brasil, Henrique Meirelles, foi um dos primeiros a indagar onde está a \”porta de saída\” do novo pacote americano em preparação. Ou seja, se o governo de Barack Obama mostrará, como os alemães, de que forma sairá do problema fiscal, para evitar que os emergentes fiquem com acesso cortado aos créditos por muito tempo.
Os Estados Unidos têm a opção, que outros países em dificuldades não têm, de simplesmente imprimir dólar, que é a moeda de reserva internacional.
O problema é que isso pode resultar em taxa de juros mais altos. E pode-se chegar ao ponto de haver tanto título do Tesouro americano no mundo que os investidores comecem a se indagar por que acumulam tantos ativos em dólares, derrubando então seu valor, como notou o professor Alan Blinder, da Princeton University.
Stanley Roach, presidente do Morgan Stanley Ásia, disse ao IHT que a situação é simples: quando o governo americano decide ir ao mercado em busca de somas gigantescas como agora, está pedindo a emprestadores do mundo todo a se levantarem e \”nos dar o dinheiro\”.
Nesse cenário, a reunião de cúpula do G-20, no próximo mês de abril, em Londres, deve tomar alguma decisao sobre o novo papel do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Uma ideia é aumentar em muito a emissão de SDR, que são as obrigações do FMI, que os países poderiam usar como reserva. Seria o primeiro passo para a criação de uma moeda alternativa ao dólar como reserva internacional.
Para Henrique Meirelles, a vantagem é que os países que têm muitas reservas não dependeriam de um único país. Suas reservas seriam ancoradas também em outra moeda. Do ponto de vista da economia mundial, o FMI teria recursos substanciais para financiar o comércio internacional dos emergentes e em desenvolvimento.