A Fundação Escola Superior de Direito Tributário (Fesdt) realizou na semana passada, entre os dias 26 e 29, o VII Congresso de Direito Tributário em Questão, na cidade de Gramado. O encontro contou com a participação de mais de mil pessoas, entre advogados, tributaristas, contadores e empresários, que discutiram a necessidade de reforma tributária e redução na carga de impostos. Os painéis abordaram ainda a execução fiscal, uso e transferência dos créditos do ICMS, PIS, Cofins e os direitos dos contribuintes, entre outros temas. O presidente da entidade, Luiz Antonio Bins, ressaltou a importância do Congresso na discussão de temas fundamentais para o País como a reforma tributária, a CSS, o Cofins. \”A cada ano, o Congresso recebe cada vez mais participantes de várias partes do Brasil e de fora dele.\” Um dos temas analisados no encontro, ainda recente no regime tributário nacional, foi o Simples Nacional. O sistema, também chamado Super Simples, completou, terça-feira, um ano de vigência e é considerado um mistério para muitos especialistas. O assunto foi abordado no painel Simples Nacional – Aspectos Críticos, Avanços e Medidas Complementares, que contou com a participação do gerente de Políticas Públicas do Sebrae Nacional, Bruno Quick, e do professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Edvaldo Pereira de Brito, entre outros. A avaliação do docente da UFBA é nada positiva sobre o novo regime voltado às micro e pequenas empresas. Segundo Brito, a Lei Complementar 123, com propósito de estabelecer as regras para disciplinar a cobrança tributária, complicou ainda mais ao criar inúmeras regras. São 30 resoluções. \”Cada uma mais complicada que a outra.\” Ele também faz críticas em relação ao aumento da carga tributária com regras confusas. De acordo com o especialista, no caso estadual é ainda pior. O ICMS, por exemplo, na substituição tributária impede que o substituto e o substituído utilizem o crédito, ou melhor, paga-se antes de vender e, se não vender mais adiante, perde-se. \”O Simples é um desastre\”, conclui o professor. Além disso, são 52 anexos para discriminar as alíquotas do Simples. A conseqüência, diz ele, é a falta de entendimento por parte de empresários e até mesmo de muitos tributaristas. Outra questão abordada foi o direito dos contribuintes. O professor das faculdades de Direito da Pucrs e Ufrgs Juarez Freitas destacou o direito fundamental à tributação justa e proporcional, com a proibição do caráter confiscatório, isto é, com o pleno respeito à capacidade contributiva. De acordo com Freitas, deve ser reconhecido o direito à tributação apta a prevenir desequilíbrios da concorrência predatória, em função da elevada informalidade. \”É preciso assegurar ainda o direito fundamental à imparcialidade, que demanda a valorização crescente da Administração Tributária como a carreira de Estado, autônoma em relação a partidos e governos, ou seja, com prerrogativas estatais típicas e indelegáveis, que são, em última instância, garantias do próprio contribuinte.\” Alterações freqüentes nas normas tiram tranqüilidade dos contribuintes Na rotina de empresários, contadores e contribuintes em geral, é comum o grande número de alterações na legislação tributária e os transtornos que trazem ao trabalho. Cabe ao Fisco informar corretamente e dar prazos para adaptação, não ferindo a Constituição Federal. O Dever de Orientar e o Poder de Atuar foi tema da palestra apresentada pelo professor de Direito Tributário da PUC-SP José Souto Maior Borges. \”Quando o Fisco muda uma orientação em vigor, não pode começar a autuar antes de comunicar aos contribuintes da alteração, dando tempo para os ajustes.\” Borges critica a quantidade de mudanças feitas na legislação e credita a medida à fome voraz dos governantes em arrecadar. A CPMF, diz ele, é um exemplo. O que era para ser provisório tornou-se definitivo. Derrubada no Congresso, poucos meses depois, o governo surge com uma proposta para o seu \”retorno\”, desta vez sob o nome de CSS. \”Esse tributo não tem nenhuma virtude a não ser a facilidade de arrecadação.\” Em meio a tantas regras novas, cabe ao contador ser o instrumento de aplicação das ferramentas para o correto emprego da legislação. O profissional contábil também tem o papel de orientar o empresário sobre as formas de tributação. \”No Brasil, a pessoa que constitui sua própria empresa mostra-se arrojada, pelo simples fato de enfrentar várias obrigações fiscais.\” Para ele, a Constituição está uma colcha de retalhos. \”É a reforma da reforma o tempo todo e não sabemos se um dia parará. Reformas tributárias com alterações no ICMS são remendos ao sistema.\” O ideal, na opinião do especialista, seria uma simplificação tributária. Borges diz que o chamado Imposto Único não terá validade. Falta integração ao regime latino-americano para possibilitar o crescimento do País, seguindo os moldes da União Européia. Rigotto quer agilidade na votação da mudança O ex-governador Germano Rigotto, que ocupa o cargo de coordenador da Reforma Tributária no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República, criticou a agilidade do Congresso na votação das mudanças. Ele falou no painel Reforma Tributária – Proposta do Governo Federal e a Avaliação Crítica à Luz da Qualidade e da Simplificação da Tributação, dos Limites da Carga Tributária e da Preservação da Federação. Rigotto pediu a prioridade da regulamentação do novo ICMS e do IVA Federal. Segundo ele, é necessário fazer as simulações e verificar o impacto das alíquotas em cada setor, o que possibilitará maior segurança à sociedade sobre as mudanças realizadas. O IVA Federal reúne Cofins, PIS, Cide, Salário Educação, CSLL e IRPJ em apenas um. O IPI seria mantido como imposto seletivo e para fins de política industrial. Rigotto destacou a necessidade de uma boa formatação dos fundos de desenvolvimento regional e de equalização, o que permitiria solucionar possíveis perdas com a implantação do novo regime tributário, bem como problemas dos estados exportadores, como é o caso do Rio Grande do Sul. Para agilizar a votação no Congresso, Rigotto diz que é necessário o envolvimento de toda a sociedade, cobrando dos parlamentares a análise da proposta. Líder da reforma tributária no governo FHC, ele fez uma análise de todo o processo histórico do tema na Câmara desde aquele período. \”A situação de instabilidade de um sistema tributário é um dos fatores que levam ao conservadorismo, à resistência de mudar. Essas resistências inviabilizaram a reforma tributária anteriormente.\” Já no governo Lula, o projeto foi entregue ao Congresso juntamente com os governadores de todos os estados. Rigotto salientou os pontos positivos que a proposta pode gerar, apesar de considerá-la ainda incompleta. Ela racionaliza o sistema tributário nacional e prevê redução da cumulatividade e desoneração da folha. Porém, não dá recursos maiores para estados e municípios. Alguns setores foram prejudicados com a implementação do PIS/Cofins A introdução do PIS/Cofins mudou a forma de tributação das empresas, prejudicando alguns setores econômicos. Para a procuradora da Fazenda Nacional Denise Lucena Cavalcanti, houve uma considerável mudança na forma de tributação de várias empresas, principalmente em relação às que elegeram como regime de tributação do Imposto de Renda o Lucro Real. Denise participou do painel sobre PIS/Cofins – Não-cumulatividade: Princípio ou Regra de Tributação? Ela explicou que a finalidade da não-cumulatividade foi de desonerar a cadeia produtiva, observando os pressupostos da neutralidade fiscal e da manutenção dos níveis de arrecadação. \”Considerando as diversidades dos setores da economia, em algumas situações, como é o caso das empresas prestadoras de serviços, ainda precisarão ser feitos ajustes legais para que não ocorram aumentos na carga tributária.\” Denise explica que, em relação aos setores de atividades comercial e industrial, houve considerável melhora na tributação, vez que permitiu que esses passassem a ter direitos de créditos. A procuradora da Fazenda Nacional diz que, para a arrecadação, tais medidas foram positivas, considerando que hoje as contribuições sociais representam uma das principais arrecadações do Tesouro Nacional. \”Houve um considerável aumento da receita bruta do Tesouro Nacional quando introduzido o modelo da não-cumulatividade do PIS/Cofins, podendo ser facilmente constatado pelos relatórios do Tesouro Nacional, disponíveis no site www.stn.fazenda.gov.br.\” Denise lembra que é preciso considerar que alguns setores da economia e determinadas receitas ainda merecem ser reajustados para que não ocorra uma distorção tributária, uma vez que a finalidade de melhora do sistema tributário não é simplesmente o aumento da arrecadação. \”Tributar em limites suportáveis é essencial à economia. Sem dúvida, a não-cumulatividade do PIS/Cofins ainda carece de reparos para que possa alcançar sua finalidade\”, afirma. Leilão de precatórios é imoral, diz especialista A utilização dos precatórios para fins de compensação de tributos foi o tema que encerrou o VII Congresso de Direito Tributário em Questão. A professora da Universidade Federal do Paraná Betina Treiguer Grupenmacher criticou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a possibilidade de realização de leilão dos precatórios. \”A proposta estabelece uma regra imoral. Um documento que valeria R$ 1 mil, por exemplo, será readquirido pelo ente federado por R$ 300 mil\”, estipula. Segundo ela, entre os entes federados, os maiores entraves ao pagamento de precatórios ficam por conta de estados e municípios. A União, por sua vez, tem por hábito pagar o que deve. Os governadores costumam criar mais empecilhos para dificultar o uso dos precatórios. A emenda propõe um calote por estabelecer o pagamento em dez anos. \”Se somos instados a pagar nossas dívidas tributárias, também o Estado deve quitar o que deve. O exemplo deve partir dele para que todos sejamos bons pagadores.\” Uma emenda constitucional do ano de 2000 regulamentou a utilização dos precatórios.