Há pouquíssimo tempo, o mundo foi assolado com milhares de perdas de vidas diante de um inimigo repaginado, um desafiante antigo do ser humano que passou por um upgrade e ressurgiu com potência máxima. Foi no segundo semestre de 2019 que o Covid-19 (coronavírus), tendo como epicentro a República Popular da China, invadiu o mundo, provocando mortes, fechando mercados, gerando fortes abalos econômicos, etc.
Como dito, não era um inimigo desconhecido, mas uma nova cepa, descoberta em 2019 e, por isso, designado de Covid-19. Os efeitos do vírus iam desde pequenos resfriados até a síndrome respiratória aguda grave (Sars-CoV), essa última responsável por milhares de internações hospitalares pelo globo, com muitos óbitos, ou pacientes com sequelas graves e ainda não superadas. Até o presente, os números de óbitos pelo mundo superaram a barreira dos seis milhões de indivíduos, tendo o Brasil atingido 10% deste número, ficando logo atrás dos EUA, país com maior número de óbitos por coronavírus.
Com o avanço tecnológico na medicina apresentado no final do século 20 e início do século 21, foi possível, num curto espaço de tempo, desenvolver imunizantes, vacinas contra o Covid, que passaram a ser aplicadas pelo mundo no segundo semestre de 2020, tendo o Brasil iniciado esse processo em 17 de janeiro de 2021. Tal instrumento foi o que mostrou ser o mais eficaz no combate ao vírus (não obstante as iniciativas de uso obrigatório de máscaras, proibição de aglomerações, etc.), acelerando uma forte blindagem contra o patógeno. Embora não fosse plenamente eficaz, tornou-se fundamental ao controle da doença, permitindo às pessoas retomarem suas vidas gradativamente.
Contudo, nem bem superada ainda a epidemia de Covid-19, mas já bem controlada, o mundo sofre um novo revés com a recente invasão da Rússia sobre a Ucrânia. Além do fator de violações a direitos humanos em sequência, com bombardeios sobre a população civil ucraniana, diante de uma guerra absurda e desnecessária (não que haja motivos para guerras), o cenário reacende o estopim da antiga guerra fria entre os EUA e a Rússia, as duas maiores superpotências nucleares do planeta. Nesse sentido, entre outros temas, retoma-se o debate em torno de uma terceira e devastadora terceira guerra mundial. Mas, independentemente dela, Estados, mercados e grandes grupos econômicos apresentam suas armas para um combate diferente, mas bastante devastador.
De um lado, tem-se o território da Ucrânia, que sempre foi reprimido pelo falecido Estado Soviético, sendo a mesma uma nação muito rica em terra arável e minérios, um dos principais países produtores mundiais de ferro, manganês, titânio, entre outros. Além disso, por ser vizinha da Rússia, a Ucrânia está a poucos quilômetros da capital Moscou, o que a torna importante do ponto estratégico russo.
Contudo, a Ucrânia procurou novas oportunidades, e tentava seu embarque junto ao bloco da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), assim como junto à União Europeia, abandonando a sua antiga controladora, por assim dizer. É sabido que a Otan, na verdade, é um pacto militar liderado basicamente pelos EUA, com o qual logrou colocar bases militares em países europeus amigos, com fulcro a resistir à cortina de ferro soviética, que implementou o Pacto de Varsóvia. Este último cessou, mas a Otan ainda perdura.
Tal fator desencadeou uma violenta reação do presidente russo Vladimir Putin, que declarou guerra ao país vizinho, iniciando uma invasão por terra e ar sobre o mesmo. Os problemas entre ambos são mais antigos, mas esta nova iniciativa bélica é iniciada em 24 de fevereiro de 2022, e ainda perdura. O principal fator da guerra, ou os verdadeiros motivos, somente a história vai ensinar. O fato é que esse novo problema mundial grave desencadeou diversas consequências econômicas sobre o mercado, como havia sido feito pela epidemia Covid-19, afetando largamente os consumidores em escala global.
Em termos de Ucrânia, a mesma está com ao menos 30% de sua economia estagnada. A Rússia, que tal como o Brasil, é uma grande produtora de commodities, com poucos produtos industrializados, mas muita matéria-prima. É o terceiro maior produtor de petróleo no mundo, e o terceiro em produção de gás natural. Assim, vários países dependem da produção russa. Ocorre que a guerra na Ucrânia provocou uma cisão em termos de mundo, com aqueles que são totalmente contrários à ação russa, e aqueles que não apoiam, mas também não a condenam, como China, Índia e outros. A Europa se mostra amplamente contrária aos deleites do Presidente Vladimir Putin, o que tem gerado uma contenção das exportações russas, o que vai conduzindo a uma quebra dos mercados mundiais de commodities, com aumento progressivo de preços.
Por outro lado, EUA e seus aliados, tem aplicado uma sequencia de sanções econômicas à Rússia, que por sua vez retalia com restrição de exportações. Mas do que uma guerra armamentista, o maior conflito parece ser o econômico, em que se assiste à resistência do povo russo aos embargos que se somam, até que isso não seja mais sustentável.
Em termos de Brasil, a guerra está conduzindo a um aumento da inflação, com a elevação no preço internacional do petróleo e de alimentos, com queda de investimentos no Brasil, sendo que a redução na atividade econômica europeia vai prejudicar a exportação de produtos brasileiros, afetando a balança comercial. Por outro lado, poderia ser positiva a valorização das commodities brasileiras, eventual desvalorização do dólar, etc. O mundo deixa de vender a Rússia, mas também não pode comprar dela.
A ministra da Agricultura brasileira, Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias, chegou a solicitar ao comitê de segurança alimentar da Organização das Nações Unidas (ONU), para que fertilizantes não fossem incluídos na lista de sanções, permitindo a compra e venda destes junto à nação russa. O comércio de fertilizantes é indispensável para garantir a segurança alimentar do mundo, salientou a ministra, sendo que o Brasil, uma espécie de celeiro do mundial, tem 85% de seus fertilizantes advindos da importação, sendo que a Rússia responde por um quarto dessas remessas. O efeito é devastador em termos de aumento de produtos.
Com a crise na Ucrânia, o preço do barril de petróleo do tipo Brent (referência usada pela Petrobras) chegou a subir mais de 40% em um mês e superar o patamar de US$ 130/barril no mercado internacional, o que acabou replicando no aumento da gasolina (18%), do diesel (25%) e do gás de cozinha no Brasil (16%), sendo que esses produtos já vinham sofrendo forte elevação, e puxavam a inflação desde o início da pandemia da Covid-19.
E todo esse cenário repercute fortemente na mesa do consumidor, que pagará mais caro pelo alimento, considerando-se a produção e a logística, especialmente porque a grande parte da produção brasileira é escoada por caminhões em estradas.
Entre as sanções aplicadas pela ONU e pela União Europeia, visando dissuadir a invasão russa, tem-se o bloqueio de transações financeiras com o Banco Central da Rússia, e o fechamento do espaço aéreo continental para aeronaves russas. Por outro lado, com o mundo totalmente interligado, uma quebra da Ucrânia, e pior ainda, da Rússia, geraria um devastação em mercados digna de recordar a quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1929.
Há uma intenção internacional de gerar um cabedal de dificuldades financeiras a Rússia, mas não é possível projetar a falência da mesma, o que seria um estado de quebra global, logo após o Covid-19, quando o mundo mostrava estar tentando superar o arrocho decorrente dos isolamentos.
Na mesma linha, setores privados, grandes grupos econômicos, entraram também na guerra e passaram a atirar com suas armas contra a Rússia. Dezenas de empresas de diferentes setores anunciaram deixar de fazer negócios com a Rússia em represália à invasão da Ucrânia, com destaque para Dell Technologies e Apple, Volkswagen, Ford e BMW. O Booking suspendeu serviços de reservas na Rússia e na Bielorrúsia, a Shell informou que não mais compraria petróleo russo enquanto vigente a crise.
No entanto, o destaque simbólico maior surge do McDonald\’s, uma quase \”embaixada\” norte americana, presente mais de 119 países do mundo, com mais de trinta e cinco mil restaurantes, fechou 850 lanchonetes presentes na Rússia. Com isso, perdem os consumidores opções de escolha e compras, mas também surge um problema grave de desempregos com as saídas e restrições advindas destas empresas, e que acabam gerando também aumento elevado de preços e escassez de produtos.
Por outro lado, da outra ponta, um tribunal russo decidiu em 21/3/2022 que a Meta, empresa proprietária do Facebook, Instragram seria uma organização extremista, que estaria permitindo postagens de violência contra soldados russos. Assim, as duas plataformas foram proibidas de operar em território russo. O descumprimento da decisão pode resultar em prisão daqueles que expõem o logo de uma das duas redes sociais da Meta em público, como o site de uma loja, por exemplo. Comprar anúncios do Facebook ou do Instagram, ou negociar ações da Meta restará capitulado como \”financiamento de organização extremista\”, resultando em um processo criminal.
Ou seja, além da guerra armamentista, existe uma forte batalha econômica, entre gigantes, visando acuar o povo russo e seu presidente, à espera de recuo na invasão à Ucrânia. É claro que, apesar dos efeitos econômicos sobre a nação russa, que está sob o julgo de um presidente com fortes inclinações ditatoriais, tais medidas são largamente melhores do que o perigo de uma guerra com uso de armas nucleares.
E, como não poderia deixar de ser, esse cenário de fortes restrições a exportações e importações afeta o mercado global, e acaba escasseando o alimento na mesa do consumidor, que para conseguir o mesmo, tem que pagar mais caro. A guerra econômica sempre via implicar mais mazelas à população de menor renda, já que essa não tem condições de suportar as oscilações do mercado, reproduzindo-se maior miséria, não bastasse a queda de empregos decorrente dos fechamentos de empresas durante o Covid-19.
Novamente, o consumidor, vulnerável por natureza, como diz o artigo 4