Uma decisão da 3ª Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) servirá de precedente para as empresas em
recuperação judicial que respondem por dívidas fiscais federais. O caso
envolve a Varig e a União. O desfecho da discussão, porém, não terá
efeitos práticos para as partes, pois a Varig faliu em 2010 e qualquer
crédito seria agora destinado à massa falida.
No processo, a União pede que os US$ 75
milhões referentes à venda da companhia, ocorrida em 2006, fossem
penhorados para garantir o pagamento de inúmeras execuções fiscais. O
STJ, no entanto, não aceitou os argumentos da Fazenda por entender que,
se a tese fosse atendida, a empresa quebraria, o que iria contra o
objetivo da Lei de Recuperação Judicial de Empresas (nº 11.101), de
2005.
A União defende no processo que poderia e
teria direito a requerer a penhora. Isso porque, ainda que a empresa
estivesse em recuperação judicial, as execuções fiscais (cobranças de
débitos tributários) estão à parte do procedimento. Esses débitos,
portanto, poderiam ser cobrados.
O advogado que na época da recuperação
representava a Varig, José Alexandre Corrêa Meyer, do escritório Rosman,
Penalva, Souza, Leão, Franco Advogados, afirma que a União possuía
várias ações de execução contra a empresa que não estavam garantidas
(sem depósito em dinheiro equivalente ou outros bens). De acordo com
ele, os débitos fiscais não se sujeitam à Lei de Recuperação, mas à Lei
de Execuções Fiscais e podem ser cobrados. Por isso, nesse caso, há um
conflito de normas que possuem o mesmo status, que precisaria ser
resolvido.
Segundo Meyer, o entendimento do STJ foi
o de que se a venda de uma unidade isolada fosse destinada ao pagamento
de débitos fiscais, a recuperação da companhia em dificuldade seria
prejudicada e a norma, criada para esse fim, seria esvaziada.
O advogado Gilberto Giansante, do
Giansante Advogados, diz que a questão envolve o conflito de duas leis –
a de execuções fiscais e a de recuperação. Segundo ele, a penhora é um
pré-requisito da execução para que esta tenha andamento. E a recuperação
judicial tem o objetivo de manutenção da atividade da companhia.
Segundo ele, a decisão conseguiu harmonizar as normas.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do
processo, afirma em seu voto que a recuperação judicial foi desenhada
com o objetivo de viabilizar a superação de crises econômico-financeiras
que abalam empresas e empresários, pois se reconheceu a importância
social das companhias como agentes financeiros que geram bens, empregos e
tributos, alavancando o desenvolvimento econômico e social do país. Ela
acrescenta que se o plano for bem-sucedido haverá capital para o
pagamento do crédito tributário, acrescido de mora (multas e correções
necessárias).
O advogado especialista em recuperações,
Júlio Mandel, do escritório Madel Advocacia, elogia a decisão. Segundo
ele, atualmente o Estado não participa do risco do negócio, não concede
crédito às empresas em dificuldade e não se sujeita ao plano de
recuperação. Aliado a esses fatores, ainda hoje não existe parcelamento
fiscal para as recuperandas.
A Lei de Recuperação Judicial prevê a
aprovação de uma norma nesse sentido, mas apesar dos inúmeros projetos
de lei apresentados ao Congresso, nenhum foi aprovado até hoje. De
acordo com Mandel, o interesse maior da norma, como seu nome indica, é a
reabilitação econômica da companhia em dificuldade.