Na oitava queda consecutiva, o dólar desvalorizou-se ontem 1,48%, cotado a R$ 1,9240, menor patamar desde 30 de setembro do ano passado. Nos oito últimos pregões, a moeda caiu 5,55%. No acumulado do ano, a baixa alcança 17,57%. O tamanho da queda de ontem pareceu aos analistas exagerado e francamente contraditório em face da mudança ocorrida no posicionamento de um player fundamental à definição do rumo da taxa de câmbio. Os investidores estrangeiros não parecem muito convencidos de que o dólar percorre no Brasil um canal de queda inescapável. Os hedge funds que fazem operações nos dois maiores pregões de derivativos cambiais da BM&F – justamente os segmentos que mais são responsabilizados pela amplificação do viés primário ditado pelo fluxo cambial e pela crise externa – mudaram radicalmente de posição em dólar futuro na virada do mês, passando de “vendidos ” em US$ 3,06 bilhões para “comprados” em US$ 1,34 bilhão. Até parece que não ficaram satisfeitos com o lucro de quase 10% proporcionado pela posição vendida em maio.
O posicionamento global dos fundos externos, que inclui também o mercado de cupom cambial, já comprado, sofreu leve declínio, de US$ 639 milhões para US$ 269 milhões. Os bancos também não se mostram muito estimulados a apostar em mais quedas acentuadas do dólar, tanto que reduziram sua posição liquidamente “vendida”, de US$ 5,32 bilhões no dia 29 para US$ 4,76 bilhões no dia 1º. Para os analistas, não há possibilidade de uma derrocada do dólar se os hedge funds não se postarem pesadamente “vendidos”. O recorde de “venda” a futuro dos aplicadores externos, de US$ 10,33 bilhões, foi marcado no dia 13 de julho de 2007.
Embora a posição vendida em dólar dos bancos domésticos seja expressiva, a falta de entusiasmo das apostas contra o dólar retira dos mercados de derivativos cambiais da BM&F o estigma de maior fonte de pressões manipulativas de baixa sobre a moeda americana. E pode dar certa razão aos que atribuem ao fluxo de capitais em direção da Bovespa a maior parte da culpa pela atual onda de apreciação do real. O lucro oferecido no mercado acionário brasileiro é sem igual: quem entrou com US$ 100 mil no último pregão de 2008 e aplicou em ações representativas do Ibovespa, mandou para fora ontem US$ 169 mil.
Isso se saberá com certeza hoje, depois que o BC divulgar os dados fechados sobre a balança cambial de maio. E também sobre o total adquirido por ele em seus leilões à vista. Ele não para de comprar desde o dia 8, mas como interrompeu, no dia 28, a divulgação diária do volume adquirido ficou difícil estimar a intensidade e a eficácia das intervenções. O certo é que, se o dólar não está sendo derrubado pelas armações sintéticas feitas nos segmentos derivativos, seria muito fácil impedir o declínio à vista da moeda. Bastaria fazer leilões mais frequentes (três ou quatro por dia) e retirar todo o excesso antes que algum empoçamento momentâneo definisse a dimensão da baixa. E atuar com as operações frequentes contra o “day trade”, que consiste em vender de manhã e recomprar mais barato à tarde. Se o BC secar o fluxo e impedir o “day trade” irá neutralizar os dois flancos principais de ataque ao dólar.
Mas os players “vendidos” em câmbio futuro não abriram mão, segundo analistas, da sua função de interferir decisivamente na rota do dólar. Após os ganhos de maio, estão esperando que se definam duas variáveis-chave do jogo: a imposição ou não pelo governo de tributos sobre as aplicações externas e a dimensão do corte da taxa Selic. E se o Banco Central está demorando a adotar o IOF no ingresso de dólares pode ser porque planeja intensificar o declínio do juro básico. Tal medida monetária poderá ser mais eficiente na contenção da queda do dólar do que a outra, fiscal. Não só porque reduz o atrativo da arbitragem entre os juros internos e os externos (a parte menor do ganho), mas sobretudo porque amplia o poder de compra de dólares do BC, ao diminuir o custo da esterilização dos reais emitidos para as aquisições. E se o BC age para conter a variação cambial estará neutralizando a fatia gorda dos rendimentos dos hedge funds. Não se deve esquecer que o juro real brasileiro não é mais tão exorbitante quanto foi no passado. Ontem, para uma taxa nominal de 9,24%, prometeu 5,02%.